14.2.07

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 42

Quarta-feira, 14 de Fevereiro 2007.

Belo treino.
Grande treino.
Grande ji-geiko.
Fiz jodan-kamae contra o senhor Osaka durante uns bons cinco minutos. Não lhe acertei uma (ou acertei uma?) mas que é que isso interessa? Curti p'ra caraças. (PS.: Obrigado Rui, por me cederes o teu lugar. Fico a dever-te uma.)

No fim, Osaka san referiu-se apenas ao facto de hoje ter sido o último treino antes do estágio com os senseis Itto e Ariga. Acho que ele está contente com a condição técnica em que o pessoal se encontra.

Foi um último keiko excelente.

Obrigado a todos.

Vemo-nos num dojo por aí.

13.2.07

KATA: SIM OU SIM E PORQUÊ? (4 E ÚLTIMO)

Para assistir aos dez katas actuais (7 tachi + 3 kodachi) clique no link
http://www.youtube.com/watch?v=XWzdIpayeFk

Nakanishi Chuta Tanesada não é um nome imediatamente reconhecido no mundo das artes marciais. De tal modo, que até hoje há quem discuta se estudou kenjutsu instruído por Ono Jiroemon Tadakata, o quinto representante da tradição do Ono-ha Itto-ryu, ou pelo sexto, Ono Jiroemon Tadakazu.

No entanto, o que se sabe é que depois de alguns desacordos com os seus superiores, Nakanishi Chuta abandonou o estilo Ono-ha Itto-ryu e fundou a sua própria escola de kenjutsu denominada Nakanishi-ha Itto-ryu*.

Quando, por volta de 1750, Nakanishi teve a idéia (mais tarde implementada pelo seu filho e sucessor Nakanishi Chuzo Tadakata) de desenvolver e melhorar as protecções existentes utilizadas dos praticantes de kenjutsu**, estava, de certa maneira e pela primeira vez, a separar as águas daquilo a que hoje comumente nos referimos como kendo e kenjutsu, ou se se quiser ser um bocadinho mais radical, entre shinai-kendo e kendo-kata.

Claro que muitos anos e muitos acontecimentos tiveram de ter lugar antes que o kendo se transformasse naquilo que é hoje, e é também claro que Nakanishi Chuta não terá nunca (injustamente?) a fama de um Miyamoto Musashi, mas o seu papel de pioneiro na concepção e melhoramento do equipamento protector foi, é e deverá ser sempre entendido um dos maiores e mais importantes contributos para o desenvolvimento não só do kendo, mas do próprio budo.

Basicamente, o que Nakanishi Chuta fez foi separar e identificar os diferentes elementos que, digamos assim, constituem, por um lado, o “vocabulário” e, por outro, a “gramática” da linguagem do kendo.
Desde essa altura, o kenjutsu, propriamente dito, e tudo o que ele envolve, kumitachi, kata, reiho, etc, passa a ser o vocabulário, a fonte, a origem das diferentes técnicas.
A parte de combate, e na falta de melhor palavra, chamemos-lhe kendo, passa a ser a gramática, que é como quem diz, a utilização dos vocábulos no diálogo (combate) com o opositor.

Chegamos assim ao fim da nossa viagem. Para que serve kata?
Continuando a abusar um bocadinho da metáfora da linguagem, e esperando que não da vossa paciência, kata serve para se poder falar melhor.
Kata serve para se saber a origem das palavras que trocamos todos os dias.

Kata ensina a ver (enzan no metsuke), ensina ritmo e ma-ai; ensina a respirar, a posicionar-se e a deslocar-se.
Kata ensina a tomar iniciativa e a esperar.
Kata ensina a liderar e a seguir.
Kata ensina tudo isso e muito, muuuuito mais.

Em resumo, kata ensina os fundamentos da boa linguagem do kendo.
E essa, é preciso não esquecer, é como qualquer outra linguagem:

O QUE INTERESSA NÃO É FALAR DEPRESSA, O QUE INTERESSA É FALAR BEM.

Abayo.


*“Ha” significa facção ou variante. Assim, Nakanishi-ha Itto-ryu significará algo como “a variante Itto-ryu de Nakanishi”.
**Acerca deste assunto, ver a versão corrigida do artigo “A escola da paciência” algures neste blog.

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 41

Segunda-feira, 12 de Fevereiro 2007.

Hoje as palavras do senhor Osaka centraram-se apenas sobre a postura a ter quando se executa sho-men uchi.

Muito brevente, recomendou apenas que se mantenha o corpo direito durante toda a execução do movimento.

Estava muito económico com as suas declarações, hoje o sensei.

O treino? O treino não foi tão "barra pesada" como nos últimos dias mas foi bastante vigoroso, a moda do kakarigeiko continua, com kakarite a decidir a duração de cada ronda, muito kirikaeshi, depois men, kote-men... depois ji-geiko... enfim, foi bom.

Kirikaeshi para acabar... foi bom.

Até quarta...

8.2.07

KATA: SIM OU SIM E PORQUÊ? (3)

(À laia de introdução)
No kendo, o combate não deverá estar apenas centrado sobre o facto de tocar ou ser tocado, mas deverá debruçar-se sobre a busca de uma plenitude de si-mesmo no acto do combate; e quem não perceber isto, só muito dificilmente poderá perceber o porquê de praticá-lo*.

Já sabemos que o kendo não é uma repetição directa da prática da arte do sabre dos samurai.
Os samurai que se preparavam para combater na época feudal, previam e preparavam o combate de uma maneira que ultrapassava largamente a prática no dojo.
Mas convém lembrar que, por outro lado, nos séculos XVIII e XIX a arte do sabre, o kenjutsu, desenvolveu-se e aprofundou-se, sobretudo, através da prática nos dojos. Os praticantes, que procuravam a profundidade e a eficácia da arte, limitaram, no entanto, o número de técnicas em relação às que tinham sido usadas na época das guerras feudais.


Ao mesmo tempo, várias codificações técnicas e regras de combate foram implementadas TENDO EM VISTA FACILITAR A BUSCA dessa mesma profundidade e constituiram a estrutura de uma arte do sabre que era então denominada kenjutsu ou gekiken.
Kenjutsu que, dentro desse quadro estrutural, atingiu um nível notável no fim da época Edo.

O significado da prática do sabre mudou progressivamente nos finais do século XIX, virando-se ainda mais no sentido da sua interiorização e dando assim origem ao kendo. As técnicas foram (ainda mais) limitadas e é nesse novo enquadramento que os adeptos do kendo procuram a profundidade do combate.
E é essa mudança qualitativa que marca a nascença do budo.
(Fim da tal espécie de introdução).


Já me perguntei várias vezes neste blog e volto agora a perguntar:
Para que serve então a prática do kendo?

O leitor mais atento simplesmente recorrerá ao primeiro parágrafo da introdução acima e responderá: “Para buscar a plenitude de si-mesmo durante o acto de combate.”
Mas, sob a capa essa resposta aparentemente tão simples, há muito mais que se lhe diga. Se não vejamos, então porque não praticar simplesmente uma outra arte marcial ou um desporto de contacto?
É inegável que, se a dita plenitude de si mesmo “se esconde” debaixo do acto de combate, então o lugar e o momento onde essa plenitude pode ser descoberta, surgirá tão fácil ou dificilmente no kendo como numa outra actividade marcial (leia-se budo) qualquer.

Ou não?

E assim, entramos agora naquela fase em que eu digo aquilo que acredito em relação ao tema.

Eu acredito que a resposta à pergunta é não.
Acredito que, nos dias que vivemos, o kendo continua a ser o mais próximo que se consegue chegar dessa tão desejada plenitude do combate, no budo, e que o mesmo possui, desde a sua criação, todos os instrumentos necessários e indispensáveis para o efeito, coisa que nenhuma outra arte marcial moderna (exceptuando talvez a naginata) se pode gabar.

Dirão:
Mas o shinai não é uma katana. Com certeza que não.
As técnicas são limitadas em número e em utilização. Podemos dizer que sim, embora haja peritos que possam discordar de tal frase.
O kendo “transformou-se demasiado” em desporto. Parece-me que nenhuma afirmação demonstra mais a ignorãncia e o desconhecimento total da realidade que essa.

Meus amigos deixemo-nos de histórias. A verdade é que, mais que não seja, o kendo é a única arte marcial japonesa, das que se debruçam sobre o uso da espada, que possui no seu curriculum a prática de combate livre. Vão buscar os kenjutsu’s que quiserem nenhum deles pratica o combate livre.
Mesmo casos extremos e muito “avançados” como, por exemplo, o Ono-ha Itto-ryu, famoso sobretudo por ser o estilo tradicional de kenjutsu da Polícia de Tóquio, não pratica ji-geiko.

E é a prática do ji-geiko, RECORRENDO AO USO DE EQUIPAMENTO APROPRIADO DE PROTECÇÃO, que faz toda a diferença.

Mas temos de concordar que a plenitude do combate com shinai apesar de poder ser alcançada pela via do ji-geiko, não corresponde exactamente, em termos técnicos, ao uso de uma katana.

Depois de isso só há duas coisas a dizer:
1ª - Bokuto ni yoru kendo kihon waza keiko ho;
2ª - Nihon kendo-no-kata;


Depois deste elogio rasgado à arte marcial que pratico e que adoro, concluo no próximo post. Prometo.



*Na verdade, estou plenamente convencido que este é o busílis da questão; o que explica a pequena quantidade percentual de praticantes que continuam a prática do kendo, uma vez passada a fase de deslumbramento inicial.

7.2.07

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 40

Quarta-feira, 7 de Fevereiro 2007.

Que lhes posso eu dizer que ainda não lhes tenha dito???
Ou, melhor ainda, que nos pode ele dizer que não nos tenha dito ainda?

O treino de hoje, desculpem a expressão, foi do caraças.

Vejam só, back to basics:
Tai-so... shomen-suburi... sayumen-suburi... seiza... kirikaeshi (bué)... kakari-geiko (buéreré)... kirikaeshi (50 sem parar). Seiza... e já está.

Nas suas palavras finais Osaka sensei encorajou as hostes a fazer sempre "kirikaeshi bonito". Só assim, diz ele, o nível do nosso kendo pode subir.
Especialmente na última série do dia (mesmo que seja uma série de 50 como hoje), o último shomen deverá ser sempre forte e bem marcado... como se fosse ippon.

Mais fácil de dizer do que de fazer.

Tou feito em papa... e ralada.

Até segunda, pois que sexta-feira há reunião da Assembleia Geral e não há treino.

5.2.07

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 39

Segunda-feira, 5 de Fevereiro 2007.

Enfim, :-) mais um dia "rico" em kirikaeshi. :-D
Parece que o sensei Osaka está decidido a só parar de fazer kirikaeshi quando formos todos minimamente eficientes na execução do mesmo.
Desta vez, depois de (mais) uma sessão espectacular de kirikaeshi-geiko, as suas palavras finais foram breves e extremamente precisas. Com três palavrinhas apenas se pronuncia a expressão "te-no-uchi".

E foi só isso que ele disse: no kirikaeshi, falta te-no-uchi.

Nota mental para o próximo dia: Lembrar de fazer kirikaeshi com mais e melhor te-no-uchi.

É assim. Falta sempre alguma coisa. Nunca se sabe tudo.

Quer dizer que isto dá pr'á vida toda?... hein?... É?...

2.2.07

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 38

Sexta-feira, 2 de Fevereiro 2007.

O "curso intensivo" de kirikaeshi prossegue a bom ritmo.
E o dia de hoje não foi excepção. Kirikaeshi, kirikaeshi e mais kirikaeshi e... ji-geiko.

E teria sido um dia mais apenas, não fosse a presença do nosso ilustre sempai Nuno Ricardo que, arribando de terras do norte, nos deu o prazer de ilustrar ao vivo a arte de bem fazer kirikaeshi em qualquer dojo.

No fim, as palavras do sensei Osaka viraram-se, inevitavelmente, para kirikaeshi.
Disse-nos que temos de ter atenção com a posição das mãos no momento do impacto.
Ter cuidado em fazer bem o ãngulo sayu-men de um lado e de outro, usando sempre a mão esquerda como referência, ao meio.

Que o mesmo é dizer, cortar com ângulo igual de ambos os lados.

Por fim, deixou uma pequena nota acerca da movimentação dos pés. Deve ser sempre igual... o tamanho dos passos para a frente e para trás, certo?

E não disse mais.

Depois disso, já a caminho de Campo de Ourique disse-me mais qualquer coisa, disse-me que o pessoal que vai fazer o estágio com Itto sensei e Ariga sensei vai ter uma surpresa. E mais não digo, pois se calhar já toda a gente sabia menos eu.

1.2.07

KATA: SIM OU SIM E PORQUÊ? (2)

Para poder escrever este pequeno resumo da história de kendo-no-kata socorri-me do excelente artigo “A Brief Synopsis of The History Of Modern Kendo” da autoria do Dr. Alex Bennett que, desde já, recomendo vivamente.

No princípio do século XX, numa tentativa de unificar (e popularizar e manter sob controle durante a sua disseminação) as variadissimas tradições e escolas de kenjutsu, o Dai Nippon Butokukai, à época a instituição estatal que geria os destinos das artes marciais japonesas, decidiu desenvolver uma série de kata que podessem ser praticados por todos, independentemente dos seus antecedentes marciais.

Em 1906, o primeiro comité encarregado da tarefa, dirigido por Watanabe Noboru, apresentou o resultado dos seus esforços sob a forma de 3 kata: Jodan (ten=céu), Chudan (chi=terra) e Gedan (jin=humano).

No entanto, devido à grande oposição surgida face a esta série de kata, a mesma acabou por ser posta de lado sem nunca chegar a ter a circulação e a disseminação nacional para que fora desenvolvida.

O problema agravou-se quando, em 1911, o governo decidiu que o kenjutsu deveria ser incluído como parte integrante no currículo de educação física das escolas japonesas.

Mais uma vez, o Butokukai ficou encarregado de criar e desenvolver uma série de kata que tornasse possível uma disseminação efectiva e unificada.
Neste segundo comité, os 5 mestres de kenjutsu, conhecedores de vários ryuha e responsáveis pelo trabalho, foram Negishi Shingoro, Tsuji Shimpei, Monna Tadashi, Naito Takaharu e Takano Sasaburo.

Em 1912 apresentaram os Dai Nippon Teikoku Kendo Kata (Kendo Kata do Grande Japão Imperial) que consistiam em 7 kata de tachi contra tachi e 3 kata de tachi contra kodachi.
Inúmeras mudanças e emendas da versão original foram feitas ao longo dos anos que se seguiram mas, na sua essência, esses 10 kata ainda hoje constituem o que os adeptos modernos praticam e a que chamam Nihon Kendo Kata ou kendo-no-kata.

No próximo post, depois desta pequena introdução histórica, vamos finalmente “apresentar o caso” e tentar demonstrar, tanto quanto possível, porque é que kendo kata é, senão essencial, pelo menos deveras importante para qualquer kendoka que se preze dessa denominação.

A PALAVRA DO SENHOR (OSAKA) 37

Quarta-feira, 31 de Janeiro 2007.

Depois de um treino muito vocacionado, uma vez mais, para kirikaeshi, as palavras do senhor Osaka, no fim do dito, focaram-se sobre... bem, kirikaeshi.
E parece (parece???) que cada dia há coisas novas e importantes acerca deste exercício aparentemente tão simples que nós, para variar, não topamos.

Se todo este trabalho de repetição de kirikaeshi, se trata de mostrar ao pessoal que kirikaeshi é mais do que aparenta, então tenho a certeza que, pelo menos comigo, a coisa está a resultar.

Ontem o sensei Osaka dizia uma coisa que, confesso, já me tinha passado pela cabeça e acerca da qual às vezes "me passo". Trata-se daquela mania que muita gente tem, e que se vê noutros exercícios além de kirikaeshi, a mania de, dizia eu, começar a fazer o exercício "na diagonal", ou em zig-zag.

Kirikaeshi não é ji-geiko, caso alguém ainda não tenha notado. E aquele "jeitinho" que alguns têm de sair na diagonal (com "muito espírito") depois de cada série de avanços e recuos é simplesmente errado dizia ontem Osaka san.
Kirikaeshi faz-se sobre uma linha recta imaginária traçada no chão.

Há um motivo pelo qual este kirikaeshi é como é. E, segundo o que sensei Osaka dizia ontem, tem também a ver com a colocação da mão esquerda... há tanto tempo que não se falava nisto.... ao centro, pois claro.

Para os amantes das linhas diagonais, no entanto, há esperança.
Existe pelo menos um tipo de kirikaeshi no qual o motodachi recua, em zigzag, num padrão pré-determinado.

Mas é o motodachi que origina o zigzag... e não o kakarite.

E, pronto, já está.