ou
Os devaneios de um kendoka quando impossibilitado de praticar.
O “ken” do kendo, creio que todos concordarão, está à vista. Com maior ou menor dificuldade todos conseguimos aperceber, pelo menos, o que é necessário para que o “ken” seja praticado.
E todos os que praticam, do mesmo modo, com maior ou menor dificuldade, serão unânimes em concordar que, bem vistas as coisas, o “ken” é até bastante limitado e não é, digamos, nada do outro mundo.
Se tivermos em consideração que, independentemente das “variações” migi, hidari, morote e katate, temos à nossa disposição, basicamente, apenas quatro ataques diferentes, o “ken” não surgirá aos nossos olhos como uma actividade muito complexa ou elaborada.
Para não falsear a informação, podemos até ser um bocadinho mais exigentes e juntar à “lista técnica” os diferentes grupos de técnicas de bloqueio e antecipação.
Assim, temos: oji-waza e debana-waza... ah e, já agora, também hiki-waza, claro; e assim... de utilização frequente... pouco mais temos.
Para comparar com o judo por exemplo, digamos que, só no capítulo das projecções, sem contar com imobilizações no solo e estrangulamentos, a arte de Jigoro Kano deve ter o dobro ou o triplo dos ataques do kendo, se calhar mais.
Mas porque é que uma coisa, aparentemente, assim tão simples é, na realidade, tão difícil? (parece-me que já perguntei isto antes) Acho que a resposta se encontra na parte que falta da palavra kendo.
Na sílaba “do”. Senão, vejamos, é tudo um problema de perspectiva:
“Ken” é o shinai, é o waza que o shinai executa. “Ken” é jutsu, é o melhor ou pior domínio de cada waza. “Ken” é o corpo, o espaço e as deslocações do corpo no espaço. Certo?
“Ken” é shiai (absolutamente!!!).
“Do” é tudo o resto. “Do” é o que não se vê. É rei-ho, zanshin e kigurai; “Do” é ki, seme, kizeme, tame e, em último caso, sutemi-no-itto (será? parece-me que sim). Correcto?
“Do” é kata (será???).
“Ken” é o que se vê. “Do” é o que se sente (esta gosto, saiu bem...).
Sem “do”, o “ken” não passa de uma série, mais ou menos bonita conforme o executante, de habilidades e malabarismos.
Mas por seu lado, sem “ken”, o “do” não passa de um amontoado de conceitos vagamente filosóficos mas completamente inúteis.
Os dois não podem passar um sem o outro, estão condenados a complementar-se.
Afinal, de que serve existir um caminho se não existir um corpo para podermos caminhar? Por outro lado, de serve saber caminhar se não existir um caminho? (muito filosófico, hein? Faz-me lembrar aquela da árvore que cai na floresta e se ninguém... hum... enfim... adiante)
A falta de um dos dois elementos leva inevitavelmente ao desequilíbrio do praticante, tal como, aliás, este post faz prova ;-).
19.10.06
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2 comentários:
Ora lá está, mas será assim tão válido tentar separar o "Ken" do "Do"?
Não se faz a evolução em ambos quase exclusivamente através do keiko? Aonde acaba a aprendizagem do "Ken" e começa a do "Do"?
Quando executo um Men, quanto tento executá-lo com a forma correcta e distância correcta, será que isso é só treino do "Ken". hmmm ou será que é na repetição do mesmo movimento vezes e vezes sem conta, procurando em cada movimento uma forma "ainda mais correcta" que começa o "Do".
:P o que acha sempai? Aonde começa o "do"? No dojo?
Há uma história verdadeira que eu acho deliciosa, é acerca de um hachidan que está a fazer um estágio de arbitragem e às tantas reúne o grupo à sua volta para lhes mostrar qual a diferença entre fazer um men com "sae", que marca Ippon, e um men sem "sae" que obviamente não deve marcar.
O problema é que ele NÃO CONSEGUE por mais que queira, executar um men sem "sae".
Ao fim de bastantes tentativas, está toda a gente a rir, incluindo o próprio, que acaba por pedir a um voluntário para fazer o que ele não consegue fazer:
Um men mal feito ;-).
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