24.10.05

REI-GI (ETIQUETA)

“Diz-se que o kendo começa e acaba com rei-gi (...*). O aspecto físico de rei-gi manifesta-se na saudação (vénia) que executamos à entrada do dojo ou do shiai-jo, começando assim cada treino com uma prova de respeito pelo lugar onde se pratica e pelas pessoas que aí praticam. No fim da prática, é através da repetição do processo que agradecemos a todos aqueles com quem praticámos e nos retiramos do dojo. O processo natural que daí deve resultar é que essas boas maneiras sejam transportadas para o dia-a-dia do praticante.
O rei-gi do kendo é um procedimento correcto (que pode ser adaptado**) como modo de tratamento para com todas as pessoas com que se lida nas actividades diárias. No kendo, uma falha no comportamento é uma falha moral para o carácter e para o treino do kendoka. Em termos práticos o kendo é uma forma de arte (marcial***) cujo propósito é derrotar um adversário num combate mental e físico. Na ausência de regras de etiqueta do princípio ao fim, o kendo transforma-se numa mera briga com o oponente, tendo com o único objectivo vencer a qualquer custo. Kendo com rei-gi, por outro lado, permanece uma arte marcial e o adversário a bater somos nós próprios. Com isso em mente, devemos ser agradecidos ao nosso adversário quando ele nos atinge, pois ao expôr a nossa fraqueza permite-nos melhorar. Porque a prática do kendo é uma permuta de técnicas, o kendoka deve sempre ser educado para com a pessoa que lhe oferece semelhante presente.”

Post-scriptum do tradutor - A etiqueta e comportamento dentro do dojo de kendo (bem como de muitas outras artes, marciais e não só) são fruto de uma evolução que dura há literalmente centenas de anos e cujo principal mentor tem sido uma escola de etiqueta e boas maneiras fundada, se a memória não me falha, aproximadamente no século XIII, na era Muromachi, escola essa apelidada Ogasawara Ryu Reihou. É claro que não vivemos no Japão do século XIII e é também muito claro para todos que não vivemos sequer no Japão; então, não deixará de ser legítimo perguntar até que ponto são estes ensinamentos práticos para o nosso dia-a-dia?

De um modo geral, eu diria que se trata sobretudo de um investimento pessoal. Daí ter acrescentado uma nota numa das traduções onde digo que esse tipo de comportamento pode ser adaptado e onde a palavra “adaptado” deve ser entendida como sinónimo de moldado, actualizado, reciclado de acordo com o bom-senso do utilizador e do meio onde o mesmo está inserido.
De um modo muito interessante, Keishousai Ogasawara, a actual presidente da Ogasawara Ryu Reihou responde:
"A forma (da etiqueta) pode variar com o tempo e com o estilo de vida, mas o fundamental é que o coração não mude seja qual for a situação."


* texto editado pelo tradutor
** nota do tradutor
*** idem

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