No próximo artigo Takaharu Naîto, o rival de Sazaburo Takano estará, finalmente, de volta. Até lá, só em http://www.tokitsu.com.
O treino no dojo da prefeitura de polícia era célebre pela sua dureza e era dirigido por grandes mestres como Yoshimasa Kajikawa, Umanosuké Uéda e Sosuké Henmi. Esses mestres, ao longo das agitações sociais do fim da era Edo, tinham tido experiência de combates com espadas verdadeiras.
S. Takano conta as suas recordações dessa época:
“Quando era mais novo, fizemos um treino de doze horas. Foi uma prova destinada a seleccionar alguns adeptos que fariam uma viagem pelo Japão. No começo éramos 10, entre os quais se encontravam Z. Kawasaki et K. Takahashi. Tratava-se de combater a partir das 18 horas até às 6 da manhã sem interrupções. Para esse tipo de provas os mestres de kenjutsu de cada comissariado de Tóquio vinham sempre com vontade de esmagar os adversários. Pela meia-noite, devido à fadiga e ao sono, os nervos começavam a relaxar e os que se encontravam no meio do dojo eram imediatamente projectados para o chão. Para triunfar no teste tinha de se conseguir ir até ao fim. Por volta das duas da manhã, senti vontade de desistir, tal era dureza. E quando eu só me conseguia aguentar em pé encostado contra a parede apontando o meu shinai ao adversário, vinham buscar-me e colocavam-me no centro do dojo para me golpearem e fazerem tsuki. Enquanto me defendia foi envolvido pelo sono que me fez baixar as pálpebras. Éramos como pequenos peixes enfrentando enormes ondas. Mas o espírito do ser humano é surpreendente. Ao escutar o canto primeiro galo, do lado de fora, descobri uma nova força com a luz esbranquiçada da aurora, a minha consciência iluminou-se. E fomos nós que levámos então, para o centro do dojo os que, algumas horas antes, nos tinham torturado, era a nossa vingança. Em todo o caso só nós três (S. Takano, Z. Kawasaki e K. Takahashi) entre os dez conseguimos concluir a prova, o que nos trouxe uma grande popularidade. Durante todo esse tempo, fui três vezes à casa-de-banho e bebi uma sopa de arroz outras três. Depois dessa prova urina-se sangue e precisa de uma semana para recuperar da fatiga. Durante o período de recuperação quando se dorme ressona-se fortemente, mas o espírito não consegue descansar, pois continuamos a sonhar que estamos a combater de shinai na mão.
Era nessa época que o treino era o mais duro.”
No decurso desse treino, chamado "tachigiri", quando a consciência estava enfraquecida pela dureza dos combates, a imagem do jovem perito chamado Takaharu Naîto voltou ao espírito de S. Takano.
“Ele fez face, durante sete horas, a todos os alunos do dojo Henmi, que o atacavam para o esmagar, para defender a honra do dojo. No entanto, não carregou o dojo às costas uma única vez.” (“Carregar o dojo às costas” era uma expressão corrente e que significava ser atirado ao chão. Nessa época, o kenjutsu incorporava bastantes projecções.)
S. Takano nunca tinha visto T. Naîto, para ele, a sua imagem não tinha uma cara, mas o seu nome estava gravado na sua memória. Quando se tornou instrutor da polícia, procurou pelo nome, pensando que talvez ele se encontrasse entre os professores. Não estava. “Ainda deve andar a viajar com a armadura às costas, a caminho de um qualquer dojo.”
PRACTICE IN THE POLICE HEADQUARTERS
In the next article Takaharu Naîto, Sazaburo Takano’s rival will be, finally, back. Until then, he’s here: http://www.tokitsu.com.
Practice in the police headquarters dojo was famous for being severe and was run by great masters like Yoshimasa Kajikawa, Umanosuké Uéda and Sosuké Henmi. Those masters, during the social turmoil of the end of the Edo period, had gone through experiences in combats with true swords.
S. Takano recalls his memories from those days:
“When I was younger, we made a twelve hours training session. It was a test to select a few experts, who would go on a trip across Japan. In beginning we were 10, including Z. Kawasaki et K. Takahashi. The idea was to fight from 6 P.M. until 6 A.M. without stops. In those events, the kenjutsu masters from each Tokyo police station, were always present and ready to smash his opponents. Around midnight, due to tireness and lack of sleep, nerves started to relax and those who were in the center of the dojo were imediately thrown to the ground. In order to be successful, you had to go all the way to the end of the training session. About 2 A.M., I felt the need to give up, because it was too difficult to handle. And, while I only could stand up if I had my back against the dojo wall, they’d pick me up, put me in the center of the dojo and they’d stroke me and did tsuki. When I was there defending myself I almost felt assleep and my eyes even closed. We were like little fish facing huge waves. But the human spirit is amazing. When I listened to the first morning rooster, outside, I found a new strength with the pale light of dawn, my conscience became clear. And then, we took them to the center of the dojo, the same ones that a few hours earlier had tortured us; it was our revenge. Anyway, from the 10 that started, only the 3 of us (S. Takano, Z. Kawasaki e K. Takahashi) made it to the end, and that brought us great popularity. During the all time of the training I went three times to the toilet and had rice soup another three. After the session you piss blood and you need a whole week to recover from the fatigue. During the recovering period you snore heavily while you sleep, but your spirit does not rest, as you keep dreaming that you are still fighting with a shinai in your hand.
That was the time when training was harder.”
During the course of the training, called "tachigiri", when conscience was weaker due to the hardness of the fights, the image of the young expert called Takaharu Naîto appeared in S. Takano spirit.
“He faced, for seven hours, all the students of the Henmi dojo who wanted to smash him, in order to defend the honor of the dojo. However he never carried the dojo on his back, one single time.” (“To carry the dojo on his back” was an current expression in those days and meant to be thrown to the ground. Back then, kenjutsu included a lot of throwing techniques.)
S. Takano had never seen T. Naîto, so his image didn’t had a face, but his name was carved in his memory. When he became a police instructor he search for the name, thinking he might find him among the teachers. He wasn’t there. “He must still be travelling, the carrying his gear, and walking to another dojo.”
31.3.05
OS PROFESSORES DE KENJUTSU NA PREFEITURA DE POLÍCIA
Vamos então ver qual era a paisagem do kenjutsu japonês quando S. Takano aceitou o cargo de instrutor na polícia de Tóquio. Mais um texto disponível em http://www.tokitsu.com.
É em Abril de 1886 que S. Takano volta a Tóquio para se tornar agente no comissariado de Honjo-Motomachi, com a função de professor de kenjutsu, ligado à prefeitura de polícia da cidade. Deixou a mulher e os familiares em Chichibu, o que demonstra bem a sua determinação em aprofundar a sua arte. A prefeitura de polícia tinha então sido transformada no maior centro da arte do sabre e um grande número de peritos vindos de todo Japão frequentavam-na quotidianamente. O comissário de Motomachi era também um adepto do kenjutsu. Ele tinha dividido os seus 180 agentes em dois grupos e tinha ordenado que, cada dia, um desses dois grupos treinasse "ji-geiko" (treino de combate). Esses treinos eram dirigidos por 3 ou 4 professores (kenjutsu-séwa-gakari) com a ajuda de 7 ou 8 assistentes. Cada um dos 90 polícias devia treinar com 5 instrutores, ou seja, uma média de 45 "ji-geiko" por dia para cada professor.
Na época em que S. Takano estava no comissariado de Motomachi, esteve lado a lado com vários peritos célebres, tais como Seikichi Kakimoto, Taménosuké Kikuchi e Juntaro Hiyama. O mais idoso era S. Kakimoto, praticante da escola Jiki-shin-kagé-ryu. Possuia a graduação de 2º kyu da prefeitura de polícia, tal como os mestres Tadatsu Shingaî, Shutaro Shimoé e Kanjuro Mihashi. A graduação de 2º kyu equivalia a "méijin", mestre superior, e era a graduação mais alta; o sistema de graduações era completamente diferente do sistema a que estamos habituados hoje em dia. T. Kikuchi era 3º kyu, "menkyo" e S. Takano era 4º kyu. Se procurarmos a equivalência ao sistema actual, pode-se dizer que o 2º kyu corresponderia ao 8º ou 9º dan.
Nessa época, considerava-se que, de entre todos os polícias de Tóquio, uns 250 teriam nível suficiente para dirigir um dojo. Em Tóquio contavam-se mais de 30 dojos de kenjutsu (ou gekiken) da polícia e não se passava um mês sem que um torneio fosse organizado. Desses, o mais importante era o "Hômén-gekiken-kaî ", que tinha lugar em todos os bairros da cidade. A capital era dividida em 6 "hômen", o hômen sendo um grupo de bairros. Cada desses grupos dispunha de 400 a 500 adeptos do gekiken. O torneio era organizado em cada "hômen" (N.Tr.:sistema de pre-qualificação?) e por vezes alguns deles agrupavam-se. Cada comissariado depositava o seu orgulho e a sua honra nesses combatentes e procurava sempre lutadores de maior talento.
S. Takano dirigia, com mais 2 ou 3 outros professores, o treino dos 90 polícias do comissariado de Motomachi. Assim que terminava os ji-geiko, mudava de roupa e partia a pé em direcção à prefeitura com o objectivo de treinar. Não lhe era possível descansar um momento, pois era habitual que, antes mesmo de o treino em Motomachi terminar, recebesse um telegrama (nessa época as ligações telefónicas entre a prefeitura e os comissariados não estavam ainda estabelecidas) da prefeitura dizendo: “Venha imediatamente para o treino.”
KENJUTSU TEACHERS IN THE POLICE HEADQUARTERS
So, let’s take a look on the japanese kenjutsu scene by the time S. Takano took the position as an instrutor for Tokyo police. Another article available at http://www.tokitsu.com.
In April 1886, S. Takano returns to Tokyo to became a policeman in the police station of Honjo-Motomachi, with the position of kenjutsu instructor, linked to the city’s police headquarters. He left his wife and family back in Chichibu, and that demonstrates his determination in deepining his art. The police headquarters back then, had been transformed in the biggest sword art center and experts from all over Japan attended classes there on a regular basis. The commander in charge of Motomachi was also a kenjutsu adept. He divided his 180 polimen into two groups and ordered that, each day, one of the two groups should train in “ji-geiko” (fighting practice). Practice was directed by 3 or 4 teachers (kenjutsu-séwa-gakari) with help from 7 to 8 assistents. Each one of the 90 policemen should practice with 5 teachers, that’s to say, an average of 45 “ji-geiko” a day for each teacher.
While in Motomachi police station, S. Takano stood side by side with some of the most famous kenjutsu experts like Seikichi Kakimoto, Taménosuké Kikuchi and Juntaro Hiyama. The eldest was S. Kakimoto, a master of the Jiki-shin-kagé-ryu school. He held the 2nd kyu rank from the police headquarters, just like masters Tadatsu Shingaî, Shutaro Shimoé and Kanjuro Mihashi. The 2nd kyu was the equivalent to "méijin", superior expert, and was the highest rank; the ranking system back then was completely different from the one we’re use today. T. Kikuchi was 3rd kyu, "menkyo" and S. Takano, 4th kyu. If we look for an equivalence to today’s system, one can say that 2nd kyu was something like 8th or 9th dan.
Back then, out of all Tokyo policemen, some 250 were considered abble to run a dojo. In the city there were more than 30 police kenjutsu (or gekiken) dojos and not a month went by without a tournament. The most important one was the "Hômén-gekiken-kaî ", which took place in all the city’s quarters. The capital was divided into 6 "hômen", the hômen being a group of quarters. Each one of those groups had some 400 to 500 gekiken adepts. The tournament was organized inside each "hômen" (Tr. N.: as a pre-qualifying system?) and at times some of the "hômen" associated and made bigger groups. Each police station put all their pride and honor in their fighters and was always looking for talented swordsmen.
S. Takano run the 90 policemen practice in Motomachi police station along with some 2 or 3 teachers more. As soon as the daily ji-geiko were over, he’d change his clothes and walk to the police headquartes with the intention of practicing some more. He could not afford to rest for a moment, because it was normal that, even before the Motomachi training was over, he’d receive a telegram (back then, telephone connections between police headquarters and stations were not yet available) from the headquarters saying: “Come immediately to practice”
É em Abril de 1886 que S. Takano volta a Tóquio para se tornar agente no comissariado de Honjo-Motomachi, com a função de professor de kenjutsu, ligado à prefeitura de polícia da cidade. Deixou a mulher e os familiares em Chichibu, o que demonstra bem a sua determinação em aprofundar a sua arte. A prefeitura de polícia tinha então sido transformada no maior centro da arte do sabre e um grande número de peritos vindos de todo Japão frequentavam-na quotidianamente. O comissário de Motomachi era também um adepto do kenjutsu. Ele tinha dividido os seus 180 agentes em dois grupos e tinha ordenado que, cada dia, um desses dois grupos treinasse "ji-geiko" (treino de combate). Esses treinos eram dirigidos por 3 ou 4 professores (kenjutsu-séwa-gakari) com a ajuda de 7 ou 8 assistentes. Cada um dos 90 polícias devia treinar com 5 instrutores, ou seja, uma média de 45 "ji-geiko" por dia para cada professor.
Na época em que S. Takano estava no comissariado de Motomachi, esteve lado a lado com vários peritos célebres, tais como Seikichi Kakimoto, Taménosuké Kikuchi e Juntaro Hiyama. O mais idoso era S. Kakimoto, praticante da escola Jiki-shin-kagé-ryu. Possuia a graduação de 2º kyu da prefeitura de polícia, tal como os mestres Tadatsu Shingaî, Shutaro Shimoé e Kanjuro Mihashi. A graduação de 2º kyu equivalia a "méijin", mestre superior, e era a graduação mais alta; o sistema de graduações era completamente diferente do sistema a que estamos habituados hoje em dia. T. Kikuchi era 3º kyu, "menkyo" e S. Takano era 4º kyu. Se procurarmos a equivalência ao sistema actual, pode-se dizer que o 2º kyu corresponderia ao 8º ou 9º dan.
Nessa época, considerava-se que, de entre todos os polícias de Tóquio, uns 250 teriam nível suficiente para dirigir um dojo. Em Tóquio contavam-se mais de 30 dojos de kenjutsu (ou gekiken) da polícia e não se passava um mês sem que um torneio fosse organizado. Desses, o mais importante era o "Hômén-gekiken-kaî ", que tinha lugar em todos os bairros da cidade. A capital era dividida em 6 "hômen", o hômen sendo um grupo de bairros. Cada desses grupos dispunha de 400 a 500 adeptos do gekiken. O torneio era organizado em cada "hômen" (N.Tr.:sistema de pre-qualificação?) e por vezes alguns deles agrupavam-se. Cada comissariado depositava o seu orgulho e a sua honra nesses combatentes e procurava sempre lutadores de maior talento.
S. Takano dirigia, com mais 2 ou 3 outros professores, o treino dos 90 polícias do comissariado de Motomachi. Assim que terminava os ji-geiko, mudava de roupa e partia a pé em direcção à prefeitura com o objectivo de treinar. Não lhe era possível descansar um momento, pois era habitual que, antes mesmo de o treino em Motomachi terminar, recebesse um telegrama (nessa época as ligações telefónicas entre a prefeitura e os comissariados não estavam ainda estabelecidas) da prefeitura dizendo: “Venha imediatamente para o treino.”
KENJUTSU TEACHERS IN THE POLICE HEADQUARTERS
So, let’s take a look on the japanese kenjutsu scene by the time S. Takano took the position as an instrutor for Tokyo police. Another article available at http://www.tokitsu.com.
In April 1886, S. Takano returns to Tokyo to became a policeman in the police station of Honjo-Motomachi, with the position of kenjutsu instructor, linked to the city’s police headquarters. He left his wife and family back in Chichibu, and that demonstrates his determination in deepining his art. The police headquarters back then, had been transformed in the biggest sword art center and experts from all over Japan attended classes there on a regular basis. The commander in charge of Motomachi was also a kenjutsu adept. He divided his 180 polimen into two groups and ordered that, each day, one of the two groups should train in “ji-geiko” (fighting practice). Practice was directed by 3 or 4 teachers (kenjutsu-séwa-gakari) with help from 7 to 8 assistents. Each one of the 90 policemen should practice with 5 teachers, that’s to say, an average of 45 “ji-geiko” a day for each teacher.
While in Motomachi police station, S. Takano stood side by side with some of the most famous kenjutsu experts like Seikichi Kakimoto, Taménosuké Kikuchi and Juntaro Hiyama. The eldest was S. Kakimoto, a master of the Jiki-shin-kagé-ryu school. He held the 2nd kyu rank from the police headquarters, just like masters Tadatsu Shingaî, Shutaro Shimoé and Kanjuro Mihashi. The 2nd kyu was the equivalent to "méijin", superior expert, and was the highest rank; the ranking system back then was completely different from the one we’re use today. T. Kikuchi was 3rd kyu, "menkyo" and S. Takano, 4th kyu. If we look for an equivalence to today’s system, one can say that 2nd kyu was something like 8th or 9th dan.
Back then, out of all Tokyo policemen, some 250 were considered abble to run a dojo. In the city there were more than 30 police kenjutsu (or gekiken) dojos and not a month went by without a tournament. The most important one was the "Hômén-gekiken-kaî ", which took place in all the city’s quarters. The capital was divided into 6 "hômen", the hômen being a group of quarters. Each one of those groups had some 400 to 500 gekiken adepts. The tournament was organized inside each "hômen" (Tr. N.: as a pre-qualifying system?) and at times some of the "hômen" associated and made bigger groups. Each police station put all their pride and honor in their fighters and was always looking for talented swordsmen.
S. Takano run the 90 policemen practice in Motomachi police station along with some 2 or 3 teachers more. As soon as the daily ji-geiko were over, he’d change his clothes and walk to the police headquartes with the intention of practicing some more. He could not afford to rest for a moment, because it was normal that, even before the Motomachi training was over, he’d receive a telegram (back then, telephone connections between police headquarters and stations were not yet available) from the headquarters saying: “Come immediately to practice”
30.3.05
O KENJUTSU E A POLÍCIA
Texto retirado e traduzido do francês de http://www.tokitsu.com com autorização do sensei Kenji Tokitsu.
Em 1879 a prática do sabre tornou-se disciplina obrigatória nas esquadras de polícia. Essa medida foi adoptada em 1877, depois da insurreição dos samurai, reunidos em torno de Saïgo, um dos heróis da restauração Meiji.
Esses samurai do sul tinham lutado, e vencido, para criar um novo regime onde esperavam ter um papel importante, mas a orientação para uma economia industrial e a formação de um exército de alistados, que os privava de sua função habitual, não lhes permitia encontrar o seu lugar. Essa insurreição foi como um fogo de artifício onde se consumia a energia feudal dos que não se podiam inserir nas cadências e nos formatos que a sociedade moderna oferecia. Nesses combates, as armas modernas foram utilizadas, mas também numerosos confrontos foram lutados corpo a corpo, com os sabres a desempenharem um papel importante. Os insurrectos formaram os " kirikomi-taï" (grupos de assalto com sabre) que atacavam principalmente durante a noite.
Esses samurai, originários de Satsuma, tinham sido educados na escola Jigen-ryu. A técnica principal dessa escola consistia em cortar obliquamente o adversário, com um grito estridente que devia ser dado como se se tratasse do último grito da vida. Esse grito de ataque tornou-se num pesadelo para os soldados do governo, pois os ataques eram aterradores e os cadáveres que ficavam estavam normalmente abertos do ombro até ao umbigo. Os ataques eram de tal forma potentes que, por vezes, a guarda do sabre (tsuba) que o soldado tentara usar para se defender, ficava enterrada no seu crânio com a violência do golpe. O treino da escola Jigen-ryu repousava sobre a repetição, batia-se 3000 vezes de manhã e 8000 vezes de tarde contra um poste, usando um bastão e ganhando balanço de uma distância de 5 metros. Relembremos que Sôkon Matsumura, que marcou a história do karaté, praticou o sabre na escola Jigen-ryu durante a sua juventude, nos anos da década de 1820. O seu aluno A. Asato, o mestre de G. Funakoshi, era, ele também, um adepto do sabre dessa escola. Em que medida é que o sabre dessa escola terá influenciado o karaté de Okinawa?
O estado japonês tinha necessidade de um grupo de peritos no sabre capazes de fazer frente aos revoltosos, e formou-o com polícias originários principalmente de famílias samurai. É desse modo que a prática do sabre é reintroduzida nas instituições japonesas, depois de vários anos de desagrado e rejeição. De 1879 a 1883 as esquadras de polícia constituiram um corpo de professores de kenjutsu do qual fizeram parte os grandes peritos do final da era Edo (Bakumatsu). Da lista fazem parte nomes como Umanosuké Ueda, Yoshimasa Kajikawa, Sôsuké Henmi, Shutaro Shimoé, Seikichi Kakimoto, Sekishiro Tokuno, Taîsaku Sakabé, Kanichiro Mihashi, Tadaatsu Shingaî e Naoaki Kanématsu. É nesse quadro que se desenvolveu uma nova fase na prática do sabre japonês que, diga-se, não era ainda designado como kendo. Continuava frequentemente a ser denominado como kenjutsu ou géki-ken.
Em 1885 o judo é integrado nas actividades das esquadras de polícia. Teriam ainda de passar 20 anos até o karaté entrar nas aulas de educação física das escolas de Okinawa e ainda mais 20 até ser apresentado na ilha principal do arquipélago japonês.
KENJUTSU AND THE POLICE
This article was found in http://www.tokitsu.com and translated from french with the authorization of Kenji Tokitsu sensei.
In 1879 sword practice became compulsory in the japanese police force. The measure was adopted in 1877, after the samurai insurrection led by Saïgo, one of the heroes of the Meiji restauration.
Those southern samurai had fought, and won, to create a new regime where they hoped to play an important role, but the orientation towards an industrial economy and the creation of an army of enlistee’s, which deprived them of their usual activity, did not allow them to find their place in society. That insurrection was like fireworks, where the feudal energy of those who did not fit inside the new cadences and formats of the new society was consumed. During those fights, modern weapons were used, but a lot of combats were also fought at close range, and the swords played a very important role. The insurrectionists formed the " kirikomi-taï" (sword assault groups) who usually attacked at night.
Now these samurai, mainly from Satsuma, had been formed in the Jigen-ryu school. The primaryl school’s technique consisted in cutting the adversary obliquely, accompanied by a loud scream, shouted like if it was the last thing you’ll ever do in your life. That fighting scream became a nightmare to the governnent soldiers, because the attacks were terrifying and the corpses left behind were generaly cut open from shoulder to navel. The attacks had such power that, sometimes, the tsuba (sword guard) of the sword that the soldier try to defend himself with, was buried in his skull due of the violence of the strike. Jigen-ryu school training was all about repetition, you’d strike a pole with a stick 3000 times in the morning and 8000 times in the afternoon, running from a distance of 5 meters. Let’s not forget that Sôkon Matsumura, who’s part of karaté history, practiced the Jigen-ryu sword style in his youth, in the years of the 1820’s decade. His student A. Asato, G. Funakoshi’s master, was also an expert of the Jigen-ryu school. How bigger influence had that sword style in the Okinawan karaté?
The japanese government needed a group of sword experts to face the rebels, and formed it with policemen primarily from samurai families. That’s how sword practice is reintroduced in japanese institutions, after a number of years of depreciation and rejection. From 1979 to 1883 the police headquarters established a permanent group of kenjutsu teachers which included some of the greatest experts of the end of the Edo period (Bakumatsu). The list includes names like Umanosuké Ueda, Yoshimasa Kajikawa, Sôsuké Henmi, Shutaro Shimoé, Seikichi Kakimoto, Sekishiro Tokuno, Taîsaku Sakabé, Kanichiro Mihashi, Tadaatsu Shingaî and Naoaki Kanématsu. Within that structure, a new phase of the japanese sword practice was developed, a sword practice that was not yet known as kendo. It was still frequently referred as kenjutsu or géki-ken.
In 1885 judo becomes part of the police headquarters activities. It would be 20 years before karaté entered the physical education classes in the Okinawan schools and another 20 until karaté is presented in the bigger island of the japanese archipelago
Em 1879 a prática do sabre tornou-se disciplina obrigatória nas esquadras de polícia. Essa medida foi adoptada em 1877, depois da insurreição dos samurai, reunidos em torno de Saïgo, um dos heróis da restauração Meiji.
Esses samurai do sul tinham lutado, e vencido, para criar um novo regime onde esperavam ter um papel importante, mas a orientação para uma economia industrial e a formação de um exército de alistados, que os privava de sua função habitual, não lhes permitia encontrar o seu lugar. Essa insurreição foi como um fogo de artifício onde se consumia a energia feudal dos que não se podiam inserir nas cadências e nos formatos que a sociedade moderna oferecia. Nesses combates, as armas modernas foram utilizadas, mas também numerosos confrontos foram lutados corpo a corpo, com os sabres a desempenharem um papel importante. Os insurrectos formaram os " kirikomi-taï" (grupos de assalto com sabre) que atacavam principalmente durante a noite.
Esses samurai, originários de Satsuma, tinham sido educados na escola Jigen-ryu. A técnica principal dessa escola consistia em cortar obliquamente o adversário, com um grito estridente que devia ser dado como se se tratasse do último grito da vida. Esse grito de ataque tornou-se num pesadelo para os soldados do governo, pois os ataques eram aterradores e os cadáveres que ficavam estavam normalmente abertos do ombro até ao umbigo. Os ataques eram de tal forma potentes que, por vezes, a guarda do sabre (tsuba) que o soldado tentara usar para se defender, ficava enterrada no seu crânio com a violência do golpe. O treino da escola Jigen-ryu repousava sobre a repetição, batia-se 3000 vezes de manhã e 8000 vezes de tarde contra um poste, usando um bastão e ganhando balanço de uma distância de 5 metros. Relembremos que Sôkon Matsumura, que marcou a história do karaté, praticou o sabre na escola Jigen-ryu durante a sua juventude, nos anos da década de 1820. O seu aluno A. Asato, o mestre de G. Funakoshi, era, ele também, um adepto do sabre dessa escola. Em que medida é que o sabre dessa escola terá influenciado o karaté de Okinawa?
O estado japonês tinha necessidade de um grupo de peritos no sabre capazes de fazer frente aos revoltosos, e formou-o com polícias originários principalmente de famílias samurai. É desse modo que a prática do sabre é reintroduzida nas instituições japonesas, depois de vários anos de desagrado e rejeição. De 1879 a 1883 as esquadras de polícia constituiram um corpo de professores de kenjutsu do qual fizeram parte os grandes peritos do final da era Edo (Bakumatsu). Da lista fazem parte nomes como Umanosuké Ueda, Yoshimasa Kajikawa, Sôsuké Henmi, Shutaro Shimoé, Seikichi Kakimoto, Sekishiro Tokuno, Taîsaku Sakabé, Kanichiro Mihashi, Tadaatsu Shingaî e Naoaki Kanématsu. É nesse quadro que se desenvolveu uma nova fase na prática do sabre japonês que, diga-se, não era ainda designado como kendo. Continuava frequentemente a ser denominado como kenjutsu ou géki-ken.
Em 1885 o judo é integrado nas actividades das esquadras de polícia. Teriam ainda de passar 20 anos até o karaté entrar nas aulas de educação física das escolas de Okinawa e ainda mais 20 até ser apresentado na ilha principal do arquipélago japonês.
KENJUTSU AND THE POLICE
This article was found in http://www.tokitsu.com and translated from french with the authorization of Kenji Tokitsu sensei.
In 1879 sword practice became compulsory in the japanese police force. The measure was adopted in 1877, after the samurai insurrection led by Saïgo, one of the heroes of the Meiji restauration.
Those southern samurai had fought, and won, to create a new regime where they hoped to play an important role, but the orientation towards an industrial economy and the creation of an army of enlistee’s, which deprived them of their usual activity, did not allow them to find their place in society. That insurrection was like fireworks, where the feudal energy of those who did not fit inside the new cadences and formats of the new society was consumed. During those fights, modern weapons were used, but a lot of combats were also fought at close range, and the swords played a very important role. The insurrectionists formed the " kirikomi-taï" (sword assault groups) who usually attacked at night.
Now these samurai, mainly from Satsuma, had been formed in the Jigen-ryu school. The primaryl school’s technique consisted in cutting the adversary obliquely, accompanied by a loud scream, shouted like if it was the last thing you’ll ever do in your life. That fighting scream became a nightmare to the governnent soldiers, because the attacks were terrifying and the corpses left behind were generaly cut open from shoulder to navel. The attacks had such power that, sometimes, the tsuba (sword guard) of the sword that the soldier try to defend himself with, was buried in his skull due of the violence of the strike. Jigen-ryu school training was all about repetition, you’d strike a pole with a stick 3000 times in the morning and 8000 times in the afternoon, running from a distance of 5 meters. Let’s not forget that Sôkon Matsumura, who’s part of karaté history, practiced the Jigen-ryu sword style in his youth, in the years of the 1820’s decade. His student A. Asato, G. Funakoshi’s master, was also an expert of the Jigen-ryu school. How bigger influence had that sword style in the Okinawan karaté?
The japanese government needed a group of sword experts to face the rebels, and formed it with policemen primarily from samurai families. That’s how sword practice is reintroduced in japanese institutions, after a number of years of depreciation and rejection. From 1979 to 1883 the police headquarters established a permanent group of kenjutsu teachers which included some of the greatest experts of the end of the Edo period (Bakumatsu). The list includes names like Umanosuké Ueda, Yoshimasa Kajikawa, Sôsuké Henmi, Shutaro Shimoé, Seikichi Kakimoto, Sekishiro Tokuno, Taîsaku Sakabé, Kanichiro Mihashi, Tadaatsu Shingaî and Naoaki Kanématsu. Within that structure, a new phase of the japanese sword practice was developed, a sword practice that was not yet known as kendo. It was still frequently referred as kenjutsu or géki-ken.
In 1885 judo becomes part of the police headquarters activities. It would be 20 years before karaté entered the physical education classes in the Okinawan schools and another 20 until karaté is presented in the bigger island of the japanese archipelago
29.3.05
A JUVENTUDE DE SAZABURO TAKANO (CONTINUAÇÃO)
Já sentiam falta dele? Pois aqui estamos de novo. Para saber tudo o resto sobre a vida deste grande mestre de kendo basta ir a http://www.tokitsu.com.
Voltemos então à história do mestre de kendo S. Takano que deixámos na altura em que acabava de tomar a direcção do dojo familiar na sua província natal.
Em Março de 1886 S. Takano recebeu uma carta de Tesshu Yamaoka que lhe pedia que, se tivesse oportunidade, se deslocasse a Tóquio para lhe fazer uma visita. Assim que lhe foi possível, Takano fez a viagem e reencontrou-se com o seu mestre que já não via fazia dois anos. Depois de lhe perguntar notícias sobre o dojo de Chichibu, Tesshu continuou:
- A propósito, não quer entrar para a prefeitura da polícia com instrutor de kenjutsu?
- Como?
- Acho que esta proposta lhe deve parecer súbita. Mas o senhor Mishima, o prefeito da polícia, pediu-me para lhe apresentar uma pessoa capaz, em kenjutsu. Então pensei em si. Não precisa de me responder imediatamente, pois tem família e a responsabilidade do seu próprio dojo. Mas reflicta bem. A prefeitura da polícia conta, hoje em dia, com um grande número de peritos em kenjutsu. Se deseja estabelecer-se como um perito de kenjutsu, é uma oportunidade interessante.
E Tesshu continuou a falar:
- Um professor de kenjutsu tem a mesma patente que um simples polícia, mas o seu salário é o dobro. Se aceitar eu recomendo-o à prefeitura.
S. Takano deixa Tesshu e regressa a casa sem lhe dar uma resposta. Mas em breve estará de volta a Tóquio para aceitar a proposta de Tesshu, deixando a sua mulher e os seus familiares sozinhos em Chichibu.
Mesmo se, na força polícial, a patente de um professor era igual a de um simples agente, entrar na prefeitura sendo recomendado pelo célebre Tesshu Yamaoka oferecia-lhe a oportunidade de se confrontar com todos os grandes peritos do sabre que ensinavam então na prefeitura da polícia.
SAZABURO TAKANO’S YOUTH (FOLLOW UP)
Miss him already? Well here we are again. If you wanna know all about the life of this great kendo master just go to http://www.tokitsu.com.
So, let’s go back to the life of kendo master S. Takano, which we left by the time he’d just started taking care of the family’s dojo in his homeland.
Around March 1886, S. Takano received a letter from Tesshu Yamaoka asking him to, as soon as possible, travel to Tokyo to visit him. As soon as he could, Takano made the trip and met again with his master, whom he hadn’t seen for two years. After some questions about Chichibu’s dojo, Tesshu asked him:
- By the way, would you be interessed in joining the police force as a kenjutsu instructor?
- Excuse me?
- I guess this work offer must look a little sudden to you. But mister Mishima, the police commander, asked me to recommend him someone skilled in kenjutsu. Then I thought of you. You don’t have to answer right now, because you have responsabilities like your family and your own dojo. But think about it. The police force, today, has a great number of kenjutsu experts among it’s men. If you want to establish yourself as a kenjutsu expert, this might be an interesting opportunity.
And Tesshu went on talking:
- A kenjutsu instructor has the same rank (in the police force) as a simple policeman, but he earns twice as much. If you accept the offer I’ll recommend you to the force.
S. Takano leaves Tesshu and returnes home without giving him an answer. But soon he’ll be back to Tokyo to accept Tesshu’s proposal, leaving his wife and family back in Chichibu.
Even if, inside the police force, the rank of an instructor equals the simple policeman, being in the force, recommended by the famous Tesshu Yamaoka, offered him a chance to come face to face with all the great swordsmen that taught in the organization back then.
Voltemos então à história do mestre de kendo S. Takano que deixámos na altura em que acabava de tomar a direcção do dojo familiar na sua província natal.
Em Março de 1886 S. Takano recebeu uma carta de Tesshu Yamaoka que lhe pedia que, se tivesse oportunidade, se deslocasse a Tóquio para lhe fazer uma visita. Assim que lhe foi possível, Takano fez a viagem e reencontrou-se com o seu mestre que já não via fazia dois anos. Depois de lhe perguntar notícias sobre o dojo de Chichibu, Tesshu continuou:
- A propósito, não quer entrar para a prefeitura da polícia com instrutor de kenjutsu?
- Como?
- Acho que esta proposta lhe deve parecer súbita. Mas o senhor Mishima, o prefeito da polícia, pediu-me para lhe apresentar uma pessoa capaz, em kenjutsu. Então pensei em si. Não precisa de me responder imediatamente, pois tem família e a responsabilidade do seu próprio dojo. Mas reflicta bem. A prefeitura da polícia conta, hoje em dia, com um grande número de peritos em kenjutsu. Se deseja estabelecer-se como um perito de kenjutsu, é uma oportunidade interessante.
E Tesshu continuou a falar:
- Um professor de kenjutsu tem a mesma patente que um simples polícia, mas o seu salário é o dobro. Se aceitar eu recomendo-o à prefeitura.
S. Takano deixa Tesshu e regressa a casa sem lhe dar uma resposta. Mas em breve estará de volta a Tóquio para aceitar a proposta de Tesshu, deixando a sua mulher e os seus familiares sozinhos em Chichibu.
Mesmo se, na força polícial, a patente de um professor era igual a de um simples agente, entrar na prefeitura sendo recomendado pelo célebre Tesshu Yamaoka oferecia-lhe a oportunidade de se confrontar com todos os grandes peritos do sabre que ensinavam então na prefeitura da polícia.
SAZABURO TAKANO’S YOUTH (FOLLOW UP)
Miss him already? Well here we are again. If you wanna know all about the life of this great kendo master just go to http://www.tokitsu.com.
So, let’s go back to the life of kendo master S. Takano, which we left by the time he’d just started taking care of the family’s dojo in his homeland.
Around March 1886, S. Takano received a letter from Tesshu Yamaoka asking him to, as soon as possible, travel to Tokyo to visit him. As soon as he could, Takano made the trip and met again with his master, whom he hadn’t seen for two years. After some questions about Chichibu’s dojo, Tesshu asked him:
- By the way, would you be interessed in joining the police force as a kenjutsu instructor?
- Excuse me?
- I guess this work offer must look a little sudden to you. But mister Mishima, the police commander, asked me to recommend him someone skilled in kenjutsu. Then I thought of you. You don’t have to answer right now, because you have responsabilities like your family and your own dojo. But think about it. The police force, today, has a great number of kenjutsu experts among it’s men. If you want to establish yourself as a kenjutsu expert, this might be an interesting opportunity.
And Tesshu went on talking:
- A kenjutsu instructor has the same rank (in the police force) as a simple policeman, but he earns twice as much. If you accept the offer I’ll recommend you to the force.
S. Takano leaves Tesshu and returnes home without giving him an answer. But soon he’ll be back to Tokyo to accept Tesshu’s proposal, leaving his wife and family back in Chichibu.
Even if, inside the police force, the rank of an instructor equals the simple policeman, being in the force, recommended by the famous Tesshu Yamaoka, offered him a chance to come face to face with all the great swordsmen that taught in the organization back then.
28.3.05
A PROFUNDIDADE DO KENDO
Este texto foi traduzido a partir do original francês, da autoria de Kenji Tokitsu, disponível para leitura em www.tokitsu.com.
O objectivo do kendo é procurar a plenitude da existência através do combate, no que é acompanhado por um desprezo pelas artimanhas. Eis porque T. Naîto, o rival de S. Takano, recusava que os seus alunos ganhassem em torneios através da utilização de técnicas pouco ortodoxas. Ele preconizava um único golpe ao “men”, dizendo: “Se forem capazes de acertar no “men” como deve ser, todos os outros ataques são possíveis. Convém, por isso, aprofundar o ataque único ao “men”.” Eis o testemunho de um dos seus alunos: “Quando um aluno ganhava um combate utilizando outras técnicas que não “men”, o mestre desdenhava da vitória dizendo: “Se procuras ganhar assim, dessa maneira, nunca poderás crescer no kendo.””
Pelo contrário, se um aluno seu perdia um combate mas mantinha-se fiel à maneira ensinada pelo mestre, ele apreciava a sua maneira de perder o combate, pois a derrota era uma grande oportunidade para cultivar profundamente a percepção.”
Se conseguirem abrir sinceramente a vossa percepção em combate, na via, estarão então convencidos, com toda a certeza, seja da vossa vitória seja da vossa derrota, independentemente da apreciação dos outros. É o que explica que por vezes um kendoka de alto nível, tendo efectuado com sucesso, do ponto de vista dos juízes, os combates de exame de graduação, recuse depois a graduação superior, dizendo: “Acertei os golpes mas não encontrei a plenitude (do combate). Tendo feito um combate tão pouco satisfatório, não posso aceitar subir de graduação.” É óbvio que se trata de adeptos com uma sinceridade fora do normal, mas a consciência que leva a semelhante atitude está, mais ou menos, presente em todos os peritos de kendo de alto nível.
Essa auto-consciência é o que fundamenta as graduações. Ela constitui-se ao longo da formação e do progresso na via do kendo e é indispensável para compreender o kendo, e o budo em geral, em toda a sua amplitude.
Podemos agora entender que nas artes marciais, se possa reconhecer a derrota devido ao auto-reconhecimento de um defeito na nossa própria maneira de combater. É essa tomada de consciência que nos ajuda a avançar na busca da perfeição. Mas qual perfeição? Afinal, é preciso ver que, no kendo, o aprofundamento é atingido através de uma limitação tal das técnicas, que a eficácia atingida não se enquadra directamente nas situações de combate com que nos podemos deparar na vida contemporânea.
O contributo do kendo situa-se num outro nível. A técnica confunde-se com a maneira global de existir de um praticante durante o combate no dojo e esse combate é preparado e vivido no treino quotidiano, o qual se inscreve na continuidade da vida de todos os dias. A prática do kendo ou do budo, nesse nível, começa a confundir-se com a maneira de viver. Desta forma, o budo reafirma que o sabre dos samurai é uma concepção de vida. O que procuramos no combate de kendo é uma forma de existir plena, na qual, uma prova concreta, o confronto em combate, permite seguir a nossa progressão e evitar ilusões. O combate de ki (vontade e energia) apresenta explicitamente todas as técnicas do kendo e é uma realidade clara para todos os kendokas de bom nível. Ao precisar assim o sentido do budo, somos obrigados a reconhecer que o karaté não se encontra ainda integrado, nem em teoria, nem na prática, nessa profundidade e complexidade de percepção, (N.Tr.: feita de) vontade e energia. Não se trata de procurar uma resposta numa dicotomia entre o karaté desportivo e o karaté tradicional, ou clássico, é toda a dimensão do budo e a possibilidade de atingi-la, que este estudo sobre o kendo põe em causa.
THE DEPTH OF KENDO
This text was translated from french to portuguese and then to english; it was written by Kenji Tokitsu, and you can read it in it’s original language here: www.tokitsu.com.
The objective of kendo is to search the plenitude of the existence through combat, and is followed by a disdain regarding cunning. That’s why T. Naîto, S. Takano’s rival, refused to let his students win in tournaments by using unorthodox techniques. He was devoted to the idea of one simple “men” strike, and used to say: “If you manage to hit “men” properly, all other attacks are possible. That’s why you must perfect the single “men” strike.” Here’s the testimony of one of his students: “When one of the students won by using other then ”men” techniques, the master used to desdain the victory by saying: “If that’s the way you intend to win, you’ll never grow in kendo.””
On the other hand, if one of the students loose a fight but kept faithfull to the teachings of the master, he‘d appreciate his way of loosing the combat, because defeat was a great opportunity to deeply cultivate his perception.”
If you manage to sincerely open your perception during combat, following the path, you’ll then be convinced, without a shadow of a doubt, either of your victory or of your defeat, no matter what the others say about it. That’s the best way to explain why, sometimes, high level kendokas, having overcome with success, from the judges point of view at least, their fights during dan exams, refuse to reveive the superior rank, saying: “I hit the adversary but I didn’t find the plenitude (of the combat). Having done a so unsatisfatory fight, I cannot accept getting a higher rank.” Of course, in this case we’re talking of experts with a great sensibility, but the conscience leads to such an attitude is, more or less, present in all high ranked kendo experts. This self-conscience is the basis of all grading. It constitutes itself during formation and progress in the way of kendo and it’s indispensable to understand kendo, and budo in general, in all of it’s magnitude
We’re now able to understand why, in martial arts, we can acknowledge defeat due to the recognition of a flaw found in our own way of fighting. That’s the kind of conscience that helps us in the search for perfection. But which perfection? After all, we know that in kendo, depth is obtained through such technical limitations that the efficiency obtained does not finds a direct usage in the combat situations we may encounter in our daily lives.
Kendo’s contribution is somewhere in another level. Technique merges itself with the global way of existing of the adept during dojo combat, and that combat is prepared and lived in daily training, which inserts itself the continuity of everyday’s life. The practice of kendo or budo, at such level, starts to merge with the way of living. This is how, budo reinstates the sword of the samurai as a meaning of life. What we search in kendo combat is a fulness way of existing, in which, one particular proof, the confrontation in combat, allows us to follow our progresses and avoids illusions. Ki (will and energy) combat explicitly presents all kendo techniques and is an obvious reality to all high level kendokas. When expressing the meaning of budo in such a way, we’re forced to recognize that karaté is not yet integrated, neither in theory nor practice, in such a perception’s depth and complexity, (Tr. Note: made out of) will and energy. It’s not about finding an answer in a dichotomy between sport karaté and traditional, or classic, karaté, it’s the whole budo dimension and the (im)possibility of reaching it, that this study about kendo calls into question.
O objectivo do kendo é procurar a plenitude da existência através do combate, no que é acompanhado por um desprezo pelas artimanhas. Eis porque T. Naîto, o rival de S. Takano, recusava que os seus alunos ganhassem em torneios através da utilização de técnicas pouco ortodoxas. Ele preconizava um único golpe ao “men”, dizendo: “Se forem capazes de acertar no “men” como deve ser, todos os outros ataques são possíveis. Convém, por isso, aprofundar o ataque único ao “men”.” Eis o testemunho de um dos seus alunos: “Quando um aluno ganhava um combate utilizando outras técnicas que não “men”, o mestre desdenhava da vitória dizendo: “Se procuras ganhar assim, dessa maneira, nunca poderás crescer no kendo.””
Pelo contrário, se um aluno seu perdia um combate mas mantinha-se fiel à maneira ensinada pelo mestre, ele apreciava a sua maneira de perder o combate, pois a derrota era uma grande oportunidade para cultivar profundamente a percepção.”
Se conseguirem abrir sinceramente a vossa percepção em combate, na via, estarão então convencidos, com toda a certeza, seja da vossa vitória seja da vossa derrota, independentemente da apreciação dos outros. É o que explica que por vezes um kendoka de alto nível, tendo efectuado com sucesso, do ponto de vista dos juízes, os combates de exame de graduação, recuse depois a graduação superior, dizendo: “Acertei os golpes mas não encontrei a plenitude (do combate). Tendo feito um combate tão pouco satisfatório, não posso aceitar subir de graduação.” É óbvio que se trata de adeptos com uma sinceridade fora do normal, mas a consciência que leva a semelhante atitude está, mais ou menos, presente em todos os peritos de kendo de alto nível.
Essa auto-consciência é o que fundamenta as graduações. Ela constitui-se ao longo da formação e do progresso na via do kendo e é indispensável para compreender o kendo, e o budo em geral, em toda a sua amplitude.
Podemos agora entender que nas artes marciais, se possa reconhecer a derrota devido ao auto-reconhecimento de um defeito na nossa própria maneira de combater. É essa tomada de consciência que nos ajuda a avançar na busca da perfeição. Mas qual perfeição? Afinal, é preciso ver que, no kendo, o aprofundamento é atingido através de uma limitação tal das técnicas, que a eficácia atingida não se enquadra directamente nas situações de combate com que nos podemos deparar na vida contemporânea.
O contributo do kendo situa-se num outro nível. A técnica confunde-se com a maneira global de existir de um praticante durante o combate no dojo e esse combate é preparado e vivido no treino quotidiano, o qual se inscreve na continuidade da vida de todos os dias. A prática do kendo ou do budo, nesse nível, começa a confundir-se com a maneira de viver. Desta forma, o budo reafirma que o sabre dos samurai é uma concepção de vida. O que procuramos no combate de kendo é uma forma de existir plena, na qual, uma prova concreta, o confronto em combate, permite seguir a nossa progressão e evitar ilusões. O combate de ki (vontade e energia) apresenta explicitamente todas as técnicas do kendo e é uma realidade clara para todos os kendokas de bom nível. Ao precisar assim o sentido do budo, somos obrigados a reconhecer que o karaté não se encontra ainda integrado, nem em teoria, nem na prática, nessa profundidade e complexidade de percepção, (N.Tr.: feita de) vontade e energia. Não se trata de procurar uma resposta numa dicotomia entre o karaté desportivo e o karaté tradicional, ou clássico, é toda a dimensão do budo e a possibilidade de atingi-la, que este estudo sobre o kendo põe em causa.
THE DEPTH OF KENDO
This text was translated from french to portuguese and then to english; it was written by Kenji Tokitsu, and you can read it in it’s original language here: www.tokitsu.com.
The objective of kendo is to search the plenitude of the existence through combat, and is followed by a disdain regarding cunning. That’s why T. Naîto, S. Takano’s rival, refused to let his students win in tournaments by using unorthodox techniques. He was devoted to the idea of one simple “men” strike, and used to say: “If you manage to hit “men” properly, all other attacks are possible. That’s why you must perfect the single “men” strike.” Here’s the testimony of one of his students: “When one of the students won by using other then ”men” techniques, the master used to desdain the victory by saying: “If that’s the way you intend to win, you’ll never grow in kendo.””
On the other hand, if one of the students loose a fight but kept faithfull to the teachings of the master, he‘d appreciate his way of loosing the combat, because defeat was a great opportunity to deeply cultivate his perception.”
If you manage to sincerely open your perception during combat, following the path, you’ll then be convinced, without a shadow of a doubt, either of your victory or of your defeat, no matter what the others say about it. That’s the best way to explain why, sometimes, high level kendokas, having overcome with success, from the judges point of view at least, their fights during dan exams, refuse to reveive the superior rank, saying: “I hit the adversary but I didn’t find the plenitude (of the combat). Having done a so unsatisfatory fight, I cannot accept getting a higher rank.” Of course, in this case we’re talking of experts with a great sensibility, but the conscience leads to such an attitude is, more or less, present in all high ranked kendo experts. This self-conscience is the basis of all grading. It constitutes itself during formation and progress in the way of kendo and it’s indispensable to understand kendo, and budo in general, in all of it’s magnitude
We’re now able to understand why, in martial arts, we can acknowledge defeat due to the recognition of a flaw found in our own way of fighting. That’s the kind of conscience that helps us in the search for perfection. But which perfection? After all, we know that in kendo, depth is obtained through such technical limitations that the efficiency obtained does not finds a direct usage in the combat situations we may encounter in our daily lives.
Kendo’s contribution is somewhere in another level. Technique merges itself with the global way of existing of the adept during dojo combat, and that combat is prepared and lived in daily training, which inserts itself the continuity of everyday’s life. The practice of kendo or budo, at such level, starts to merge with the way of living. This is how, budo reinstates the sword of the samurai as a meaning of life. What we search in kendo combat is a fulness way of existing, in which, one particular proof, the confrontation in combat, allows us to follow our progresses and avoids illusions. Ki (will and energy) combat explicitly presents all kendo techniques and is an obvious reality to all high level kendokas. When expressing the meaning of budo in such a way, we’re forced to recognize that karaté is not yet integrated, neither in theory nor practice, in such a perception’s depth and complexity, (Tr. Note: made out of) will and energy. It’s not about finding an answer in a dichotomy between sport karaté and traditional, or classic, karaté, it’s the whole budo dimension and the (im)possibility of reaching it, that this study about kendo calls into question.
22.3.05
SHINAIS DE CARBONO, PELA ÚLTIMA VEZ.
Bem, bem, bem, bem, bem! Isto está a começar a tornar-se um (mau) hábito. Mas, aproveitando a época da Páscoa que se aproxima vou redimir, de uma vez, mais um "pecado" por mim cometido nas páginas deste blog. Os shinais de carbono, pois é...
Eu estava a reler umas coisas e deparei-me com os posts sobre o peso dos Hasegawa. E lembrei-me que tal dúvida já não é uma dúvida. No meio-tempo que se passou entre os referidos posts e hoje, fiz parte de uma mesa de shinai-check e... aprovei um shinai de carbono.
É verdade.
Se, para além de mim, pobre ignorante, alguém mais tivesse dúvidas, pois bem... estão esclarecidas.
Enfim, que querem? Alguns de nós ainda conseguem achar que ter a certeza sobre a pergunta é tão ou mais importante do que ter dúvidas acerca da resposta.
CARBON SHINAIS, ONE LAST TIME.
Well, well, well, well, well! This is becoming an (bad) habit. But, I'm gonna profit of Easter season being around and redeem myself, once and for all, of another "sin" I committed in the pages of this blog. Yeah, carbon shinais...
I was (re)reading some stuff and came across some posts about the weight of the Hasegawa shinais. And I remembered that doubt it's no longer a doubt. in the midterm between those posts and today, I took part of a shinai-check and... I approved a carbon shinai. That's true.
If, besides me, poor ignorant, anyone else had doubts, well... everything is clear now.
Hey, what do you want, man? Some of us still think that being sure about the question is as important, or more, than maybe knowing the answer.
Eu estava a reler umas coisas e deparei-me com os posts sobre o peso dos Hasegawa. E lembrei-me que tal dúvida já não é uma dúvida. No meio-tempo que se passou entre os referidos posts e hoje, fiz parte de uma mesa de shinai-check e... aprovei um shinai de carbono.
É verdade.
Se, para além de mim, pobre ignorante, alguém mais tivesse dúvidas, pois bem... estão esclarecidas.
Enfim, que querem? Alguns de nós ainda conseguem achar que ter a certeza sobre a pergunta é tão ou mais importante do que ter dúvidas acerca da resposta.
CARBON SHINAIS, ONE LAST TIME.
Well, well, well, well, well! This is becoming an (bad) habit. But, I'm gonna profit of Easter season being around and redeem myself, once and for all, of another "sin" I committed in the pages of this blog. Yeah, carbon shinais...
I was (re)reading some stuff and came across some posts about the weight of the Hasegawa shinais. And I remembered that doubt it's no longer a doubt. in the midterm between those posts and today, I took part of a shinai-check and... I approved a carbon shinai. That's true.
If, besides me, poor ignorant, anyone else had doubts, well... everything is clear now.
Hey, what do you want, man? Some of us still think that being sure about the question is as important, or more, than maybe knowing the answer.
20.3.05
AS DIFERENÇAS ENTRE A EFICÁCIA NO KENDO E NA ARTE DO SABRE.
executando kendo kata.
Bom, estamos quase a voltar à história dos nossos dois seguidores da arte do sabre, Takaharu Naîto e Sazaburo Takano. Entretanto, se tiverem muita pressa de saber o que se passou, pois dêem um saltinho até http://www.tokitsu.com. Está lá tudo.
No kendo, a percepção no decurso do combate não está apenas centrada sobre o facto de tocar ou ser tocado, mas debruça-se sobre a busca de uma plenitude de si-mesma no acto do combate. É por isso que se diz que o kendo ensina uma maneira de viver. Vimos antes que o kendo não é uma repetição directa da prática da arte do sabre da era dos samurai. Num combate com sabre verdadeiro não era raro que, utilizando artimanhas e/ou técnicas exteriores à prática do dojo, um samurai conseguisse vencer um perito de nível superior. Os samurais que se preparavam para combater até à morte na época feudal, previam e preparavam o combate de uma maneira que ultrapassava largamente a prática no dojo.
Os anos de 1850-1870 viram florescer a arte do sabre. Entre as escolas que ganharam importância, a escola "Ryu go ryu" desenvolveu-se devido à sua eficácia. “Ryu” significa “salgueiro” e “gô” quer dizer “força” e o fundador dessa escola sentiu-se iluminado quando, num dia de mau tempo, observou os ramos dos salgueiros que batiam na superfície da água de um rio. Convém lembrar que no século XIX a arte do sabre, o kenjutsu, desenvolveu-se e aprofundou-se, sobretudo, através da prática dos dojos. Os peritos procuravam a profundidade e a eficácia da arte, limitando, no entanto, o número de técnicas em relação às que tinham sido usadas na época das guerras feudais. As codificações técnicas e as regras dos exercícios de combate foram instituídas tendo em vista facilitar a busca da profundidade e constituiram a estrutura de uma arte do sabre que era denominada tanto kenjutsu como gekiken. Arte essa que, dentro desse quadro estrutural, atingiu um nível notável no fim da época Edo.
Mas a eficácia da escola "Ryu go ryu" consistia principalmente em pôr em causa esse mesmo quadro estrutural que regia a arte do sabre nessa época. A especialidade da escola consistia em baixar-se repentinamente durante o combate e destruir tíbia do adversário, manejando o sabre com a mesma rapidez e flexibilidade de um ramo de salgueiro que chicoteia a água. Essa técnica tinha sido rejeitada como “suja”, “vulgar”, “desviada da via”, “perversa” e, por isso, esquecida. Mas, em combate, certos peritos de alta reputação foram batidos pelas técnicas “perversas” da escola "Ryu go ryu". No final da era Edo (baku-matsu), os confrontos civís tornaram-se frequentes; os samurai tiveram de combater fora dos dojos e o kenjutsu foi posto em causa. Essa foi a razão pela qual a escola “perversa” se tornou popular entre os adeptos do sabre. Um pouco mais tarde, quando a corrente modernista (N.T.: de modernização do Japão) triunfou, a classe samurai foi dissolvida e o porte do sabre proibido. O significado da prática do sabre mudou progressivamente nos finais do séc XIX, virando-se de novo no sentido da interiorização e surgiu o kendo. As técnicas foram limitadas e é nesse novo quadro que os adeptos do kendo procuram a profundidade do combate.
Essa mudança qualitativa marca a nascença do budo.
THE DIFFERENCES BETWEEN EFFECTIVENESS IN KENDO AND IN THE SWORD ART.
Well, we are almost ready to go back to the lifestorys of our two followers of the sword art, Takaharu Naîto and Sazaburo Takano. Meanwhile, if you’re in a hurry to know what happened, all you have to do it’s to go to http://www.tokitsu.com. It’s all there.
In kendo, perception during the fight isn’t only centered about to touch or being touched, but it also focuses itself about the fullness of itself while in combat. That’s why it’s said kendo teaches a way of living. We’ve seen earlier that kendo is not a direct repetition of the samurai’s art of the sword practice. During a real sword fight it wasn’t a rare event that, by being triky and/or using out of the dojo techniques, a samurai would beat an adversary who was a better fighter than he was. Samurai who prepared themselves to fight to death during the feudal era, predicted and prepared their combats in a way that exceeded largely their daily practice inside the dojo walls.
The years between 1850-1870 saw the flourishing of the sword art. Between the scholls that gain importance, the "Ryu go ryu" school developed itself because of it’s effectiveness. “Ryu” means “willow” and “go” means force and the founder of the school felt enlightened while observing the branches of a willow, during a windy day, and how they whipped a river surface. We must now remember that during the XIX century the art of the sword, kenjutsu, developed itself mostly through the practice inside dojos. The experts were for the depth and efficiency of the art, limiting, however, the number of techniques that had been used in the feudal wars era. Technical codifying and rules in the exercices were created in order to facilitate the search of depth, and became the structure of the art of the sword, which was back then called either kenjutsu, or gekiken. And it was inside that same structure, that the art acchieved a remarcable level by the end of the Edo era.
But the effenciency of the "Ryu go ryu" school consisted mainly in staying out of the structure that ruled the art of the sword back then. The school specialty consisted in lowering the body suddenly during the fight and destroying the adversary’s tibia, using the sword with the same speed and flexibility of the willow’s branch whipping the water. That technique had been rejected as being “dirty”, “rude”, “deviated from the way”, “perverted” and therefore, forgotten. But during combat, a number of high level experts were beaten by the "Ryu go ryu" school’s “dirty” techniques. By the end of the Edo era (baku-matsu), civilian conflicts became frequent; samurai had to fight out of the dojos and kenjutsu was questionned. That’s the reason why that “perverted” school became very popular among the followers of the sword. Some time later, when the modernist tendency triumphed, the samurai class was abolished and the use of the sword forbidden. The meaning of sword practicing changed gradually in the end of the XIX century, turning again to the search of a sense of internalization and that’s when kendo appeared. The number of techniques were limited and that’s inside that new structure that the kendo followers search for the depth of combat.
That qualitative change marks the birth of budo.
13.3.05
O BUDO NÃO PODE SER UM ESPECTÁCULO
Bom... já nem sei como dizer isto outra vez... enfim, cá vai: http://www.tokitsu.com, vão lá ver.
Essa forma de combate não pode constituir um espectáculo. Pois que, para que o espectáculo seja bom, é necessário uma grande troca de golpes bem visíveis. No karaté é preciso ter numerosos golpes que exprimam a velocidade e a potência, mas também saltos que roçam o campo da acrobacia; em resumo, é preciso uma amplificação dos movimentos que seriam necessários. Todos os filmes de artes marciais se apoiam nesse aspecto. Os espectadores não ficariam satisfeitos se os dois adversários se colocassem cara a cara até que um reconhecesse a derrota, sem que houvesse qualquer troca de gestos.
E no entanto, é isso que o budo visa atingir.
O incêncio numa floresta é espectacular. A luta contra o fogo também o é, sobretudo quando intervêm os meios aéreos. Mas do ponto de vista da luta contra o incêndio, o ideal é impedir o fogo de pegar. O estádio seguinte é apagar os pequenos fogos assim que começam. Se se conseguir apagar os pequenos focos de incêndio assim que surgem, a luta contra o fogo não tem nada de espectacular. É a insuficiência na capacidade da luta inicial, que faz nascer os grandes incêndios espectaculares. O mesmo se passa com as artes marciais. É o nível de mediocridade que dá lugar aos grandes gestos técnicos espectaculares. Ao procurar bloquear os gestos do adversário o mais próximo possível da origem, o budo não se aproxima do espectáculo. Assim, por qualquer que seja o motivo, quando as artes marciais se aproximam do espectáculo, afastam-se inevitavelmente do budo. Alguns especialistas afirmam que o espectáculo serve para dar a conhecer o budo e corresponde à parte visível du um iceberg. Mas muitas vezes a parte invisível não existe senão nas palavras. A meu ver, a sua afirmação está viciada desde o princípio, pois uma pessoa que conheça a profundidade do budo não tem prazer em se dispersar na direcção de um espectáculo que trava o seu avanço na arte.
Não se trata de desprezar o espectáculo, mas de compreender que se trata de uma outra coisa que até pode ter, eventualmente, uma certa qualidade.
BUDO CANNOT BE A SHOW
Well... how can I say this again... oh well, here it goes: http://www.tokitsu.com, check it out.
This form of combat can not constitute itself as a show. Because in order to get a good show it’s necessary to have a great exchange of blows, which have to be visible to the public. In karaté, numerous strikes are needed to express the speed and the power, but also jumps that look more like acrobatics, in short, an amplification of the necessary moves is needed. All martial arts movies use that as a starting point. The spectators wouldn’t bee please to see two adversaries facing each other, until one of them recognized defeat, without any gesture in between.
And that, however, is what budo is about.
A forest on fire is spectacular. So is the fight against fire, specially when fire-fighting planes are used. But in the point of view of the fight against fire, the ideal is to stop it from even beginning. Next stage is to put down the small fires as they appear. If one manages to put an end to the small fires as soon as they appear, the fight against fire is not spectacular at all. It’s the insufficient capacity in the initial fight that gives birth to the large and spectacular forest fires. The same thing happens with the martial arts. It’s the level of mediocrity that makes place to the large technical spectacular movements. While trying to supress the gestures of the adversary, as close as possible from it’s origins, budo doesn’t get anywhere near a show. So, no matter why, whenever martial arts get closer to the show, inevitably, they’ll get way from budo. Some specialists say that a show is usefull in order to people to get in contact with budo and it’s, more or less, like the top of the iceberg. But sometimes the invisible part of the iceberg they talk about, exists only in their words. To me, that statement is corrupted from the beginning, because someone who knows budo in depth will have no pleasure at all dispersing his attention because of a show that only stops his advance in the art.
It’s not about disdaining martial arts shows, but to understand that shows are about something else, and can, eventually, have certain qualities.
Essa forma de combate não pode constituir um espectáculo. Pois que, para que o espectáculo seja bom, é necessário uma grande troca de golpes bem visíveis. No karaté é preciso ter numerosos golpes que exprimam a velocidade e a potência, mas também saltos que roçam o campo da acrobacia; em resumo, é preciso uma amplificação dos movimentos que seriam necessários. Todos os filmes de artes marciais se apoiam nesse aspecto. Os espectadores não ficariam satisfeitos se os dois adversários se colocassem cara a cara até que um reconhecesse a derrota, sem que houvesse qualquer troca de gestos.
E no entanto, é isso que o budo visa atingir.
O incêncio numa floresta é espectacular. A luta contra o fogo também o é, sobretudo quando intervêm os meios aéreos. Mas do ponto de vista da luta contra o incêndio, o ideal é impedir o fogo de pegar. O estádio seguinte é apagar os pequenos fogos assim que começam. Se se conseguir apagar os pequenos focos de incêndio assim que surgem, a luta contra o fogo não tem nada de espectacular. É a insuficiência na capacidade da luta inicial, que faz nascer os grandes incêndios espectaculares. O mesmo se passa com as artes marciais. É o nível de mediocridade que dá lugar aos grandes gestos técnicos espectaculares. Ao procurar bloquear os gestos do adversário o mais próximo possível da origem, o budo não se aproxima do espectáculo. Assim, por qualquer que seja o motivo, quando as artes marciais se aproximam do espectáculo, afastam-se inevitavelmente do budo. Alguns especialistas afirmam que o espectáculo serve para dar a conhecer o budo e corresponde à parte visível du um iceberg. Mas muitas vezes a parte invisível não existe senão nas palavras. A meu ver, a sua afirmação está viciada desde o princípio, pois uma pessoa que conheça a profundidade do budo não tem prazer em se dispersar na direcção de um espectáculo que trava o seu avanço na arte.
Não se trata de desprezar o espectáculo, mas de compreender que se trata de uma outra coisa que até pode ter, eventualmente, uma certa qualidade.
BUDO CANNOT BE A SHOW
Well... how can I say this again... oh well, here it goes: http://www.tokitsu.com, check it out.
This form of combat can not constitute itself as a show. Because in order to get a good show it’s necessary to have a great exchange of blows, which have to be visible to the public. In karaté, numerous strikes are needed to express the speed and the power, but also jumps that look more like acrobatics, in short, an amplification of the necessary moves is needed. All martial arts movies use that as a starting point. The spectators wouldn’t bee please to see two adversaries facing each other, until one of them recognized defeat, without any gesture in between.
And that, however, is what budo is about.
A forest on fire is spectacular. So is the fight against fire, specially when fire-fighting planes are used. But in the point of view of the fight against fire, the ideal is to stop it from even beginning. Next stage is to put down the small fires as they appear. If one manages to put an end to the small fires as soon as they appear, the fight against fire is not spectacular at all. It’s the insufficient capacity in the initial fight that gives birth to the large and spectacular forest fires. The same thing happens with the martial arts. It’s the level of mediocrity that makes place to the large technical spectacular movements. While trying to supress the gestures of the adversary, as close as possible from it’s origins, budo doesn’t get anywhere near a show. So, no matter why, whenever martial arts get closer to the show, inevitably, they’ll get way from budo. Some specialists say that a show is usefull in order to people to get in contact with budo and it’s, more or less, like the top of the iceberg. But sometimes the invisible part of the iceberg they talk about, exists only in their words. To me, that statement is corrupted from the beginning, because someone who knows budo in depth will have no pleasure at all dispersing his attention because of a show that only stops his advance in the art.
It’s not about disdaining martial arts shows, but to understand that shows are about something else, and can, eventually, have certain qualities.
11.3.05
O SIGNIFICADO DO COMBATE NO BUDO
Bom, este foi do pior. Mais, este foi o pior de todos. Custou muito a traduzir. Muuuito. Qualquer coisa que não percebam, e deve haver algumas partes nessa situação, podem sempre ir até http://www.tokitsu.com e verificar o texto original francês.
E boa sorte, já agora.
Ao seguir o itinerário de dois peritos de kendo que influenciaram directamente o kendo moderno e a consciência do budo no Japão, pretendi mostrar como é complexa a apreciação de um combate de kendo. As questões que se me levantaram a propósito desses artigos podem resumir-se assim: “Compreendi que existe um outro horizonte no combate do budo. Mas, na verdade, para onde nos leva a prática do budo?”
Vou suspender por um instante a história da vida de S. Takano para tentar, no limite das minhas capacidades, dar uma resposta a essa questão tão difícil e que é, justamente, o tema central desta série de artigos.
A consciência do ser no budo
Porque é que, em certas situações de combate, os mestres decidem ao contrário dos espectadores vulgares, afirmando que aquele que recebeu um golpe é que é o melhor? Já analisei essa questão apoiando-me nas opiniões dos mestres que assim decidiram. Para dissipar quaisquer ambiguidades, vamos tentar compreender o que se passa na consciência dos combatentes.
Acontece por vezes durante um treino de kendo que, face a um adepto de alto nível, executar-se um ataque, aparentemente correcto, e, no entanto, não se ficar com a sensação de ter dominado o adversário, mas muito pelo contrário, de ter sido dominado por aquele a quem se desferiu o golpe. Segundo Madame Keiko Deguitre, perita de kendo, graças à qual pude obter documentos preciosos sobre o kendo, esse tipo de experiência é uma preocupação maior entre os kendokas de alto nível. Sente-se que é o adversário nos conduz à acção de atacar e não que fomos nós a criar as condições que permitem que o ataque exista. Durante o combate existe um mal-estar enquanto não se ataca. Há uma sensação de incómodo que quase obriga a fazer o gesto de atacar. Ataca-se então com um golpe que efectivamente atinge o adversário, mas nesse caso, não se sente a satisfação de ter conseguido uma vitória, mas sente-se claramente que foi o adversário que nos “obrigou” ao gesto de ataque. Devemos inclinar-nos perante ele e agradecer-lhe por ter sido “atingido” dessa maneira.
Visto do exterior, foi você que o atingiu, logo foi você o vencedor do combate. Mas, dentro da realidade do combate, o adversário penetrou num vazio da sua percepção, sem aproveitar para atacar, e pressionou esse ponto fraco com a sua vontade e a sua energia (ki). Por outro lado, ele apresentou-lhe um ponto fraco na sua (dele) guarda enquanto mantinha a pressão sobre a sua atitude. Tudo isso criou-lhe o tal mal-estar que você não conseguiu “sacudir” senão através de um gesto de ataque. A insatisfação com o ataque deve-se ao facto de o adversário ter conseguido quebrar a intimidade do seu gesto técnico, ou seja, ter perturbado o seu "ki-ken-taï", a unidade entre o ki (vontade e energia), o ken (movimento do sabre) e o tai (centro do seu corpo). Essa desunião é causada porque você agiu sob o domínio do adversário, e assim ressente-se da falta de plenitude do acto de atacar.
Mas a superioridade de um dos adversários nem sempre é tão clara. Se um adversário, durante o combate, apenas conseguir ter uma iniciativa de avanço (sobre o outro) no domínio da percepção, não é certo que ele consiga executar um golpe magnífico. Mas, nessa situação de interferência de vontades e energias (ki), enquanto não conseguir sobrepôr-se ao oponente, ele abrirá uma falha na sua percepção e você não poderá vencê-lo. Mesmo que o seu ataque o atinja, ele não se sentirá dominado e você não se sentirá que o venceu. O que se procura é um golpe convincente para ambos os adversários, que também são árbitros. E, se um deles tenta atacar, mas sente imediatamente que o seu ataque será rechaçado logo à partida, então ele tentará atacar de outra maneira, ataque esse que será também “defendido” logo de início. Desse modo, sempre que tenta começar um ataque, a sua vontade de atacar é abafada pela do outro e não pode senão recuar no caso de o adversário decidir avançar na sua direcção. Assim ele é dominado sem sequer ser atingido. Essa é a forma ideal de dominar o adversário num combate de budo. Essa forma de domínio tornou-se ideal a partir do momento em que a arte do sabre se constituiu no kendo com o surgimento da noção de budo. O kendo sucede assim ao sabre dos samurais para quem: “O sabre, uma vez desembainhado, deve matar.”
THE MEANING OF THE COMBAT IN BUDO
Hell... this one was difficult! Hard to translate. Haaard. If there’s anything you don’t understand, and I’m sure there’ll be, you can always go to http://www.tokitsu.com and check it out in the original french text.
Oh… and, by the way, good luck with that.
While following the itinerary of two kendo experts who had direct influence upon modern kendo and the conscience of budo in Japan, was my idea to show how complex the appreciation of kendo combat is. The questions that arose related to the past articles, can be summarized as follows: “I understood there’s a different level in budo combat. But, in reality, where does budo practice leads us?”
I’ll suspend for a while the tale of S. Takano’s life, to try to find the answer, the best one I can come up with, to that very difficult question, which is, by the way, the central theme of this series of articles.
The conscience of being in budo
Why is it that, in certain fighting situations, the masters decide against the average spectators, saying that the one who received the blow is the better fighter? I’ve already analyzed that question using the opinion of the masters who decided so. In order to dissipate any ambiguities, we’ll now try to understand what’s happening inside the fighters heads. Sometimes it happens to kendokas during practice, while facing an high level expert, to execute an attack, apparently correct, and, after all, to don’t have that sensation of having dominated the adversary, but, on the contrary, of having been dominated by that same one they just stroke. According to Madame Keiko Deguitre, a kendo expert, thanks to whom I had access to precious documents about kendo, that kind of experience is a major concern among high level kendokas. You feel like it is the adversary that’s leading you to the action of attacking and that it was not you the one who created the conditions which allowed that same attack to exist. During the fight, there’s this malaise when one doesn’t attack. So, you’ll attack with a blow that effectively strikes your adversary, but even then, you don’t feel the satisfaction of having acchieved a vitory, rather you can clearly feel that it was him, your opponent that “forced” you to engage in the attack. We should then bow before him and thank him for “hitting” us that way.
When seen from the outside, you’re the one that stroke, hence you are the winner. But, seen from the inside, from the real combat, the adversary penetrated a void within your perception, without profiting to attack, and applied pressure in that weak point with both his will and energy (ki). On the other hand, he showed you a soft spot in his kamae while keeping the pressure over your attitude. All that created that malaise that you couldn’t “shake” other then through an attack gesture. The unsatisfaction with the attack is due to the fact that your adversary managed to break the interior of your technical gesture, in other words, he interfered with your "ki-ken-taï", the unity between ki (will and energy), ken (the sword) and tai (the center of your body). That separation was caused because you acted under the adversary will, and because of that you feel the lack of plenitude during the attacking act.
But the superiority of one of the fighters isn’t always so clear. If one of the adversaries, during the combat, only manages to achieve the initiative ahead (of the other) in the perception’s field, it’s not certain that he will be abble to execute a magnificent blow. But while in that situation of interferences of both will and energy (ki), as long as you didn’t manage to overcome the opponent, he will open a void inside your percetion and you will not be abble to beat him. Even if you hit, he will not feel like he’s been dominated by you and you will not fell like you’ve beated him. What we search is a convincing strike for both the fighters, who are also referees. And, if one of them tries to attack, but imediately feels his attack will be annulled right at the beginning, then he’ll try to do a different strike, which will also be “parried” right from the start. That way, everytime he tries to start an attack, his attacking will is suffocated be the opponent’s will and all he can do is to withdraw, in case the adversary decides to advance against him. So he’s dominated even without being hit. That’s the ideal way of dominating the adversary in budo combat. That way of dominating became ideal from the moment the art of the sword established itself as kendo, with the appearance of the notion of budo. So, kendo succeeds to the swords of the samurais, to whom: “The sword, once drawn, must kill.”
E boa sorte, já agora.
Ao seguir o itinerário de dois peritos de kendo que influenciaram directamente o kendo moderno e a consciência do budo no Japão, pretendi mostrar como é complexa a apreciação de um combate de kendo. As questões que se me levantaram a propósito desses artigos podem resumir-se assim: “Compreendi que existe um outro horizonte no combate do budo. Mas, na verdade, para onde nos leva a prática do budo?”
Vou suspender por um instante a história da vida de S. Takano para tentar, no limite das minhas capacidades, dar uma resposta a essa questão tão difícil e que é, justamente, o tema central desta série de artigos.
A consciência do ser no budo
Porque é que, em certas situações de combate, os mestres decidem ao contrário dos espectadores vulgares, afirmando que aquele que recebeu um golpe é que é o melhor? Já analisei essa questão apoiando-me nas opiniões dos mestres que assim decidiram. Para dissipar quaisquer ambiguidades, vamos tentar compreender o que se passa na consciência dos combatentes.
Acontece por vezes durante um treino de kendo que, face a um adepto de alto nível, executar-se um ataque, aparentemente correcto, e, no entanto, não se ficar com a sensação de ter dominado o adversário, mas muito pelo contrário, de ter sido dominado por aquele a quem se desferiu o golpe. Segundo Madame Keiko Deguitre, perita de kendo, graças à qual pude obter documentos preciosos sobre o kendo, esse tipo de experiência é uma preocupação maior entre os kendokas de alto nível. Sente-se que é o adversário nos conduz à acção de atacar e não que fomos nós a criar as condições que permitem que o ataque exista. Durante o combate existe um mal-estar enquanto não se ataca. Há uma sensação de incómodo que quase obriga a fazer o gesto de atacar. Ataca-se então com um golpe que efectivamente atinge o adversário, mas nesse caso, não se sente a satisfação de ter conseguido uma vitória, mas sente-se claramente que foi o adversário que nos “obrigou” ao gesto de ataque. Devemos inclinar-nos perante ele e agradecer-lhe por ter sido “atingido” dessa maneira.
Visto do exterior, foi você que o atingiu, logo foi você o vencedor do combate. Mas, dentro da realidade do combate, o adversário penetrou num vazio da sua percepção, sem aproveitar para atacar, e pressionou esse ponto fraco com a sua vontade e a sua energia (ki). Por outro lado, ele apresentou-lhe um ponto fraco na sua (dele) guarda enquanto mantinha a pressão sobre a sua atitude. Tudo isso criou-lhe o tal mal-estar que você não conseguiu “sacudir” senão através de um gesto de ataque. A insatisfação com o ataque deve-se ao facto de o adversário ter conseguido quebrar a intimidade do seu gesto técnico, ou seja, ter perturbado o seu "ki-ken-taï", a unidade entre o ki (vontade e energia), o ken (movimento do sabre) e o tai (centro do seu corpo). Essa desunião é causada porque você agiu sob o domínio do adversário, e assim ressente-se da falta de plenitude do acto de atacar.
Mas a superioridade de um dos adversários nem sempre é tão clara. Se um adversário, durante o combate, apenas conseguir ter uma iniciativa de avanço (sobre o outro) no domínio da percepção, não é certo que ele consiga executar um golpe magnífico. Mas, nessa situação de interferência de vontades e energias (ki), enquanto não conseguir sobrepôr-se ao oponente, ele abrirá uma falha na sua percepção e você não poderá vencê-lo. Mesmo que o seu ataque o atinja, ele não se sentirá dominado e você não se sentirá que o venceu. O que se procura é um golpe convincente para ambos os adversários, que também são árbitros. E, se um deles tenta atacar, mas sente imediatamente que o seu ataque será rechaçado logo à partida, então ele tentará atacar de outra maneira, ataque esse que será também “defendido” logo de início. Desse modo, sempre que tenta começar um ataque, a sua vontade de atacar é abafada pela do outro e não pode senão recuar no caso de o adversário decidir avançar na sua direcção. Assim ele é dominado sem sequer ser atingido. Essa é a forma ideal de dominar o adversário num combate de budo. Essa forma de domínio tornou-se ideal a partir do momento em que a arte do sabre se constituiu no kendo com o surgimento da noção de budo. O kendo sucede assim ao sabre dos samurais para quem: “O sabre, uma vez desembainhado, deve matar.”
THE MEANING OF THE COMBAT IN BUDO
Hell... this one was difficult! Hard to translate. Haaard. If there’s anything you don’t understand, and I’m sure there’ll be, you can always go to http://www.tokitsu.com and check it out in the original french text.
Oh… and, by the way, good luck with that.
While following the itinerary of two kendo experts who had direct influence upon modern kendo and the conscience of budo in Japan, was my idea to show how complex the appreciation of kendo combat is. The questions that arose related to the past articles, can be summarized as follows: “I understood there’s a different level in budo combat. But, in reality, where does budo practice leads us?”
I’ll suspend for a while the tale of S. Takano’s life, to try to find the answer, the best one I can come up with, to that very difficult question, which is, by the way, the central theme of this series of articles.
The conscience of being in budo
Why is it that, in certain fighting situations, the masters decide against the average spectators, saying that the one who received the blow is the better fighter? I’ve already analyzed that question using the opinion of the masters who decided so. In order to dissipate any ambiguities, we’ll now try to understand what’s happening inside the fighters heads. Sometimes it happens to kendokas during practice, while facing an high level expert, to execute an attack, apparently correct, and, after all, to don’t have that sensation of having dominated the adversary, but, on the contrary, of having been dominated by that same one they just stroke. According to Madame Keiko Deguitre, a kendo expert, thanks to whom I had access to precious documents about kendo, that kind of experience is a major concern among high level kendokas. You feel like it is the adversary that’s leading you to the action of attacking and that it was not you the one who created the conditions which allowed that same attack to exist. During the fight, there’s this malaise when one doesn’t attack. So, you’ll attack with a blow that effectively strikes your adversary, but even then, you don’t feel the satisfaction of having acchieved a vitory, rather you can clearly feel that it was him, your opponent that “forced” you to engage in the attack. We should then bow before him and thank him for “hitting” us that way.
When seen from the outside, you’re the one that stroke, hence you are the winner. But, seen from the inside, from the real combat, the adversary penetrated a void within your perception, without profiting to attack, and applied pressure in that weak point with both his will and energy (ki). On the other hand, he showed you a soft spot in his kamae while keeping the pressure over your attitude. All that created that malaise that you couldn’t “shake” other then through an attack gesture. The unsatisfaction with the attack is due to the fact that your adversary managed to break the interior of your technical gesture, in other words, he interfered with your "ki-ken-taï", the unity between ki (will and energy), ken (the sword) and tai (the center of your body). That separation was caused because you acted under the adversary will, and because of that you feel the lack of plenitude during the attacking act.
But the superiority of one of the fighters isn’t always so clear. If one of the adversaries, during the combat, only manages to achieve the initiative ahead (of the other) in the perception’s field, it’s not certain that he will be abble to execute a magnificent blow. But while in that situation of interferences of both will and energy (ki), as long as you didn’t manage to overcome the opponent, he will open a void inside your percetion and you will not be abble to beat him. Even if you hit, he will not feel like he’s been dominated by you and you will not fell like you’ve beated him. What we search is a convincing strike for both the fighters, who are also referees. And, if one of them tries to attack, but imediately feels his attack will be annulled right at the beginning, then he’ll try to do a different strike, which will also be “parried” right from the start. That way, everytime he tries to start an attack, his attacking will is suffocated be the opponent’s will and all he can do is to withdraw, in case the adversary decides to advance against him. So he’s dominated even without being hit. That’s the ideal way of dominating the adversary in budo combat. That way of dominating became ideal from the moment the art of the sword established itself as kendo, with the appearance of the notion of budo. So, kendo succeeds to the swords of the samurais, to whom: “The sword, once drawn, must kill.”
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