18.6.06

KOTE-ARI

É engraçado quando nos ensinam uma coisa e, por um motivo qualquer, seja ignorância, medo do conflito, ou por mera vontade própria, simplesmente aceitamo-la como certa, sem sequer ter vontade de questionar a sua veracidade.

É uma regra. Uma certeza.

Depois o tempo passa e passado algum, descobrimos que a "tal" certeza que nos ensinaram não é assim tão... certa. Há excepções.

Depois, mais algum tempo passa e passado também esse, descobrimos que a regra que nos foi ensinada afinal, é ela própria, uma excepção.

Mas vamos lá então falar de kote.

Para ser válido um ataque ao pulso deve ser executado sobre o pulso direito (migi-kote)... e quando o adversário se encontra em chudan-no-kamae. Esta é regra, certo?

Errado, esta é a excepção. Na verdade, os ataques aos dois kotes (migi e hidari) são válidos em todas as situações, excepto quando o adversário se encontra em chudan-kamae.

E MESMO ASSIM, ISSO NÃO É COMPLETAMENTE VERDADE.

Há duas (três?) situações em que se pode atacar o kote esquerdo do adversário, mesmo quando este está em chudan-no-kamae.

A teoria que diz que só se pode atacar o kote esquerdo quando o pulso do adversário se encontra mais alto do que o mune-do (em "age-gote") não é completamente verdadeira. Então e se (numa situação idealizada) o adversário se encontrar em waki-gamae? Com'é qu'ié? O pulso esquerdo, definitivamente, não está em situação age-gote. Posso atingi-lo?

A última regulamentação da AJKF (ed. 2002) declara que “A zona de alvo de kote será o pulso direito (...) contra chudan-no-kamae e ambos os pulsos contra as outras kamae".

Para definirmos o que significa "outras kamae", recorremos a um outro guia, neste caso o escrito para a Kokutai (Organização Nacional Atlética*), “(...) o kote esquerdo é também um alvo válido quando o opositor se encontra em chudan-kamae com a mão esquerda à frente, em jodan-no-kamae, hasso-no-kamae, waki-gamae, nito-no-kamae, age-gote, e outras variantes de chudan.”

Age-gote já se sabe que é quando o pulso está mais alto do que o plexus solar (ou que o mune-do, como se quiser) e/mas não se encontra em trajectória de ataque. Então e as outras variantes de chudan-no-kamae? Quer dizer o quê?

Duas coisas: Hira-seigan kamae e kasumi-no-kamae. As duas kamae mais utilizadas contra jodan-kamae.

(Nota interessante: Hoje em dia, há uma corrente de árbitros japoneses que são a favor de marcar kote se, por exemplo, durante a execução de hiki-men o combatente que sofre o ataque (para o evitar) levantar os braços e em vez de ser atingido na cebeça ser atingido no pulso.)

Tenho de falar disto com Osaka sensei... hum... quer dizer que quando assumirem seigan ou kasumi contra o meu jodan posso atacar os dois kote.

Os malandros que ontem já se babavam de contentamento, a pensar usar kasumi contra mim, vão ter uma ou duas surpresas.


*"National Athletic" no original.

4 comentários:

Kodomo disse...

Apesar disso, e olhando para Kasumi no kamae, parece-me a mim que sem recurso a harai, mesmo o kote esquerdo se encontra bem protegido pela inclinação do shinai.

De qualquer forma é muito interessante. Uma questão. No kendo moderno existe alguma situação (sem ser em kata) que se se assuma hasso-no-kamae e waki kamae?

Usagi-san disse...

Hasso, já ouvi falar de um 8º dan nipo-americano que fez numa demonstração num torneio nos states e já vi, num filme de um combate, um tipo fazer, mas é uma coisa muito excêntrica de se fazer... e o tipo que vi era mau combatente ainda por cima.

Waki-gamae nunca vi, nem acho que alguma vez vá ver...

Kasumi, em compensação, já vi fazer só com a mão direita. Mas era uma atitude muito defensiva obviamente e o kendo não deve ser assim, não é?

António disse...

A conclusão que tirei é que tenho de ler tudo outra vez porque esta informação toda passou muito depressa. :)

Usagi-san disse...

André, a tua teoria parece boa mas, infelizmente, baseia-se num equívoco.
Aquilo não é hasso-kamae como forma de transição.
É uma maneira de executar men chamada katsugi-men e parte do lado ESQUERDO do corpo do atacante; hasso-kamae, se reparares bem, é do outro lado (do DIREITO), certo?
Sorry.