Eis então a terceira e última parte do artigo de Kenji Tokitsu sensei sobre a história das artes marciais japonesas. Já sabe que para ler outros artigos do autor, nomeadamente sobre karaté, basta ir a http://www.tokitsu.com. Boa leitura.
O kendo pratica-se hoje em dia com uma armadura de protecção e um sabre de bambú (shinai). Tradicionalmente treinava-se a arte do sabre sem armadura e, umas vezes, com um sabre de madeira (bokuto ou bokken), outras com um sabre verdadeiro com a lâmina protegida. O treino consistia principalmente de exercícios técnicos codificados (kumi-tachi). De forma a se aproximar o mais possível de uma situação de combate real, os golpes eram desferidos com grande força, parando apenas no momento antes do impacto o que exigia uma grande concentração mas causava, assim mesmo, inúmeros acidentes. É no início do século XVIII que Naganuma Shirozaemon, da escola Jikishinkage-ryu, introduz as armaduras de protecção e o sabre de bambú nos treinos, de modo a permitir uma maior liberdade na elaboração das técnicas. Naganuma pode, nesse sentido, ser considerado como um dos longínquos fundadores do kendo.
Os ataques são acompanhados de um grito (kiai) que indica ao mesmo tempo qual a parte do corpo visada. Este costume é uma tradição antiga e tem o objectivo, durante o treino, de manifestar a percepção de uma falha no adversário, falha essa que está na origem do ataque. Um ataque aleatório é considerado como não tendo valor; é preciso atacar com vontade e certeza. Somente quatro partes do corpo são consideradas local de ataque: a cabeça, o flanco, os pulsos e a garganta, esta, o alvo mais difícil de atingir, mas também o mais determinante. Um ataque correcto exige uma integração simultânea da vontade (ki), do golpe do sabre (ken) e da postura do corpo (tai). Sem essa integração, nenhum golpe tem valor, mesmo que o adversário seja tocado.
O combate desenrola-se assim dentro de um quadro muito limitado. O golpe perfeito deve ser guiado por uma percepção aguçada. É necessário aperceber, ou criar, o instante vulnerável do adversário antes de fazer o ataque, de acordo com o preceito que diz: “Não ganhes depois de teres atacado, ataca depois de teres ganho”.
É por isso que, no kendo ao mais alto nível, o combate mais importante se desenrola antes que sejam desferidos quaisquer golpes: os dois combatentes tentam cada um criar um vazio na percepção do adversário, penetrar nesse vazio e marcar a sua presença de maneira inequívoca. O kendo requer, por isso, um trabalho mental cuja importância aumenta à medida que que se progride na via. Reconhecer que se foi tocado é uma fase importante da aprendizagem: o praticante agradece ao adversário por lhe ter mostrado o seu ponto fraco. Os critérios do combate são, portanto, interiorizados sem que seja atribuída grande importância aos golpes superficiais: o que se procura é “o golpe que ecoa no coração”. Hoje em dia, a internacionalização das competições desportivas arrasta consigo uma tendência para a exteriorização dos critérios, o que leva a que se procure, de uma distância maior, efectuar golpes mais superficiais, em vez de se procurar a plenitude do ataque. São dois tipos de kendo em vias de se diferenciar: um ligado à competição e outro à tradição.
O kendo é, juntamente com o tiro com arco (kyudo), a arte marcial que permite continuar a treinar até uma idade mais avançada mantendo um nível elevado, por vezes, até, progredindo. Hoje, numerosos kendokas (praticantes de kendo) de idades superiores aos oitenta anos demonstram, através da sua participação em campeonatos que lhes são reservados, o seu alto nível em exercícios de combate livre. Por isso, na óptica tradicional, aperfeiçoar o kendo implica um equilíbrio e uma integração do corpo e do espírito, o que faz com que seja considerado como um excelente método de formação global da pessoa.
The japanese martial arts (III)
Here you have it, the third and final part of Kenji Tokitsu sensei's article about the history of japanese marcial arts. You, know, if you want to read other articles from the same author, about karaté, for instance just go to http://www.tokitsu.com. Enjoy.
Today, we practice kendo with a protective gear and a bamboo sword (shiani). Traditionally, the art of the sword was practised without protective equipment and, sometimes with a wooden sword (bokuto or bokken) others, with a real sword with a protected blade. Most of the training consisted in pre-arranjed exercices (kumi-tachi). In order to get closer and closer from real combat situations, the strikes were brandished with extreme force, and were stopped just before impact, demanding a great deal of concentration, but causing, anyhow, countless accidents. In the beginning of the XVIII century, Naganuma Shirozaemon, of the Jikishinkage-ryu school, introduces protective armours and bamboo swords in training, allowing greater freedom in the development of the technics used. That’s why Naganuma is considered to be one of the forefathers of kendo.
Kendo strikes are normally accompanied by shouting (kiai) the part of the body you’re aiming at. This custom is an old tradition and it’s objective, during practise, is to reveal the perception of a flaw in the opponent, that same flaw being at the core of one’s attack. Random strikes are considered as without value, you must strike with both will and certainty. There are only four targets in the opponent’s body: the head, the torso, the wrists and, the most difficult one, and at the same time the most decisive, the throat. A correct strike demands a simultaneous integration of the will (ki), the sword strike (ken) and the body posture (tai). Without that, no strike has any value, even if the adversary is touched.
So, the fight takes place according to very limited circunstances. The perfect strike must be guided by a very accurate perception. It is necessary to be aware of (or to create) that vulnerable moment in the adversary, before striking, according to the old precept that says: “Do not win after striking, strike after winning.”
That explains why, at kendo’s highest levels, the most important fight takes place even before any strike is attempted: both fighters try to create a void in the adversary’s perception, penetrate it and mark their presence in an unequivocal manner. That’s why kendo requires a mental work whose importance grows along with the progress in the discipline’s way. To recognize you’ve been hit, it’s an important fase of the learning process, and so the kendo student should thank the adversary for showing his (her’s) week point. The fighting criteria is, therefore, interiorized and no importance is paid to superficial blows: the search is on for “the strike that echoes in the heart”. Today, the internationalization of competition drags along the tendency to an exteriorization of the criteria, leading to rather search superficial blows, made from a longer distance, instead of searching the fullness of the attack. This are the two kinds of kendo we see today, differentiating from one another: one more linked to competion and the other to tradition.
Along with kyudo ( way of the bow), kendo is the martial art that allows it’s students to continue to keep on practising at a higher level, even progressing, in despite of ageing. Today, a lot of kendokas (kendo students) with ages up to eighty years old demonstrate, through their participation in championships reserved to them, their incredible skills in combat. That’s why, in the traditional way, to perfect one’s kendo implies balance and an integration of both body and spirit, and so making it an excellent method of personnal improvement.
8.12.04
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