Em França (nota trad.: e no resto do mundo), um número considerável de pessoas interessa-se pelas artes marciais, nomeadamente pelo budo japonês. Mesmo assim, o budo não tem conhecido uma difusão suficiente, visto estar situado à margem do desporto onde o factor dominante é a competição.
Curiosamente, nem na pesquisa, nem no ensino universitários, nem mesmo no quadro da Société des Etudes Japonaises (Sociedade de Estudos Japoneses), o budo se constitui como sujeito de estudos mais sérios. No entanto, para quem procura aprofundar o conhecimento da cultura tradicional japonesa, parece-me fora de questão descartar o budo e a tradição guerreira. Com efeito, os guerreiros marcaram desde muito cedo a história do Japão e governaram a sociedade japonesa durante sete séculos, até á Restauração Meiji, há pouco mais de um século. A cultura dos guerreiros teve por isso um papel sociocultural importante que se prolongou mesmo depois de terminado o seu domínio político. Se a cultura dos guerreiros está presente hoje de uma forma manifesta no budo, ela está também, e ainda, presente de uma maneira mais alargada e profunda no comportamento dos japoneses.
Não direi, como certas pessoas, que o crescimento económico japonês do pós-guerra se deve à aplicação do comportamento guerreiro no campo económico pois a realidade parece-me ser bem mais complexa. No entanto, não me parece errado dizer que a tradição guerreira subsiste impregnada nos modelos de comportamento dos japoneses.
O período feudal deixou-nos um grande número de obras literárias e artísiticas e manifesta-se em bastantes obras culturais modernas. Nessas condições, como poderíamos abordar a cultura tradicional japonesa se nos abstraisse-mos dos elementos guerreiros?
O teatro No, a cerimónia do chá, o haïku, o bunraku, o kabuki... foram desenvolvidos numa sociedade dominada pelo sabre. Que o mesmo é dizer, com uma concepção de vida e de morte diferente da existente hoje em dia. A sensibilidade das obras culturais foi modelada pelos que viviam no tempo em que a espada tinha um papel efectivo.
Em França, os estudos aprofundados sobre a cultura japonesa parecem limitar-se aos domínios literário e artístico, abstraindo-se dos conceitos de corpo e de morte que, no entanto, eram fundamentais para todos durante a sociedade tradicional.
O facto de o budo ser excluído da reflexão intelectual é devido provavelmente à tendência cultural francesa, onde o modelo intelectual tende a excluir os problemas colocados pelo corpo. Não retomarei aqui essa questão. Simplesmente, essa situação parece-me lamentável e desejaria que o budo obtivesse um lugar honroso e justo nos estudos franceses sobre a cultura japonesa. Para isso é indispensável que os praticantes de budo ajam para fazer do budo uma prática cultural de corpo inteiro.
Próximo capítulo: O que é o budo?
11.11.05
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